Terça-feira, 21 de Janeiro de 2025
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Agosto: ouro, suor e lágrimas

Já vai (muito) distante o mês de agosto de 1385, quando se desenrolou a Batalha de Aljubarrota, um dos feitos políticos estratégicos mais importantes da História portuguesa. Todavia, tantos anos depois, a data continua a ser venerada pelos militares (é no dia 14 de agosto que se celebra o “Dia da Infantaria” no seio do Exército), investigada pelos historiadores e recriada no imaginário da população, com lendas associadas a factos reais. Mas agosto é também um mês de muitos outros feitos que aqui vão ser destacados. Ficaram igualmente na História, num outro tipo de situações, tal como as grandes desgraças que também o têm marcado

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Há quem diminua a importância da ação patriótica dos portugueses nesse dia 14 de agosto de 1385, afirmando que Aljubarrota é um mito incentivado pela propaganda salazarista. Contra o que escreveu Fernão Lopes, há quem faça a diferença entre o mais pequeno exército português e a maior formação castelhana, diminuindo a desproporção de 6 para 1 para, apenas de 3 para 1. A verdade é que é reconhecido que Aljubarrota foi a execução de uma boa tática militar que aniquilou a força maior espanhola (castelhana). Recentemente falecido, o historiador José Matoso dizia que “os mitos também fazem parte da História”.

“Se, na altura, a batalha foi vista como a personificação do direito de D. João I à coroa portuguesa, ela continua a ser olhada como um bastião da afirmação da pátria lusitana”.

 

José Matoso, in “O Jornal” de 14 de agosto de 1985

 

Uma alma portuguesa que vale a pena

Nesta maneira de ser portuguesa, as nossas gentes habitualmente tidas como mais débeis e menos bem preparadas no cotejo com os de lá de fora, têm tido grandes repercussões as conquistas trilhadas pelos desportistas que têm feito subir a bandeira verde-rubra ao lugar cimeiro dos pódios das grandes competições, fazendo também ouvir o hino em momentos que nenhum português pode deixar de enaltecer. Em geral, isso aconteceu porque houve muito suor e muitas lágrimas, muita dedicação e muito esforço, muita tenacidade e lampejos da alma a desafiar os sacrifícios do corpo. Fernando Pessoa (que não era grande desportista) já sabia que quando essa alma não é pequena tudo o que custa vale bem a pena.

“Milhares de portugueses seguiram pela televisão a final dos 5 mil metros, vibraram com a espetacular corrida de António Leitão que imprimiu um poderoso ritmo à prova. Depois de Rosa, Leitão. E, hoje, Lopes corre, de madrugada, a maratona da nova esperança”.

(Texto de capa do “Jornal de Notícias” de 12 de agosto de 1984”)

Adversários adversidades

Falar de atletas campeões como Carlos Lopes, Rosa Mota, António Leitão, Fernanda Ribeiro, Fernando Pimenta, Nélson Évora, Pedro Pichardo ou Patrícia Mamona não é displicente. Eles levaram a melhor sobre os adversários, mas, acima de tudo, sobre as adversidades. Foram campeões europeus, mundiais e olímpicos. Dos melhores de todos. Fizeram também as suas “aljubarrotas” com perseverança e afinco. Ainda assim, o sorriso dos seus rostos após as vitórias não faz esquecer as lágrimas que lhes correram sempre ao lado. Falemos de alguns desses feitos.

Até 1960 (Jogos Olímpicos de Roma), os portugueses apenas conquistaram medalhas em modalidades coletivas, essencialmente vela e hipismo. O hóquei em patins não era modalidade olímpica e o futebol só se destacaria em 1966, no mundial de Londres e Manchester. A partir dessa data, começaram a surgir novos métodos de treino, novas formas de ver e sentir o desporto em âmbitos sociais, novas maneiras de manutenção orgânica (alimentação, viagens em boas condições, alojamento digno, por exemplo), apoios oficiais que retiraram os atletas portugueses mais bem-dotados do anonimato.

Carlos Lopes e Rosa Mota foram os primeiros destaques, no atletismo. Na longa distância da Maratona. A modalidade prosseguiu com as provas de fundo, mas outras começaram a evoluir, desde o triplo salto aos cem metros, desde o salto em comprimento ao lançamento do peso. Entretanto, surgiram vencedores internacionais no judo, na canoagem, no ciclismo, no triatlo, no ciclismo, reforçando a melhoria generalizada.

UM CASO ESTRANHO

Foi o de Fernando Mamede que, excetuando um recorde mundial (10.000 metros), entre 1984 e 1987, nunca obteve marcas de grande relevo, não obstante ter estado nos Jogos Olímpicos de 1972, 1976 e 1984, em 800, 1.500, 10.000 e nas estafetas de 4×400 metros. O atleta sofreu grandes barreiras psicológicas ao longo da sua carreira (um pouco como a atual ginasta norte-americana Simone Biles) inerentes ao desporto de grande competição, o que lhe custou desistências e resultados abaixo do esperado nos campeonatos do mundo (apenas um 10º lugar como melhor marca) e da Europa (onde nunca conseguiu ultrapassar as meias-finais das provas que disputou). Em corta-mato, no Mundial de 1981, conseguiu a sua única medalha (de bronze). O ter pertencido à mesma equipa de Carlos Lopes (quando este estava no auge) e de ter tido o mesmo treinador – Moniz Pereira, no Sporting – pode ter determinado em Mamede um estranho complexo que o diminuía, inexplicavelmente.

A MORTE DE LÁZARO

Na história do olimpismo português também houve sangue, para além de suor e das lágrimas. Francisco Lázaro fez parte da primeira equipa olímpica portuguesa, nos jogos de 1912, em Estocolmo. Dispôs-se a disputar a Maratona. Depois de ter acusado o esforço num domingo de calor sufocante, o atleta, de 24 anos de idade, caiu algumas vezes durante a prova e nessas vezes se levantou. Até que, numa das quedas, desfaleceu. Morreu horas depois. Colegas de equipa viram-no a untar-se com sebo, procurando que o calor fosse menos intenso no seu corpo. Mas os poros tapados impediram a transpiração cutânea. Lázaro morreu asfixiado, no mês de julho.


UM ROL VALIOSO DE ATLETAS CAMPEÕES

Conquistas no Atletismo

Campeonatos do Mundo

OURO: Rosa Mota (Maratona, Roma 1987), Manuela Machado (Maratona) e Fernanda Ribeiro (10.000 metros, Gotemburgo 1995), Carla Sacramento (1.500 metros, Atenas 1997), Nélson Évora (Triplo salto, Osaka, 2007), Inês Henriques (50 Km Marcha, Londres 2017), Pedro Pichardo (Triplo salto, Doha,2019).

PRATA: João Vieira, Nélson Évora, Fernanda Ribeiro, Manuela Machado e Domingos Castro.

BRONZE: Fernando Mamede (Corta-mato), Nélson Évora, João Vieira, Naíde Gomes, Rui Silva, Susana Feitor, Carlos Calado, Fernanda Ribeiro e Carla Sacramento.

Campeonatos da Europa

OURO: Patrícia Mamona (Triplo salto, Torum, 2021; e Amsterdão, 2019) e Auriol Dongmo, atleta de Camarões naturalizada portuguesa, na modalidade de lançamento do peso, em Torum, 2021; Belgrado, 2022 e Cracóvia, 2023).


DATAS MARCANTES

12 de agosto | 1984
Em 1976, nos JO de Montreal, Carlos Lopes ganhava uma medalha de prata nos 10.000 metros. Era a antecâmara de feitos maiores. Com efeito, oito anos depois, em Los Angeles, Lopes ganhava o ouro na maratona. E Rosa Mota também aparecia com a medalha de bronze na maratona feminina. Pelo meio, ficava António Leitão, com bronze nos 5 mil metros. Tudo grandes distâncias ainda. Em Seul, Rosa alcançou o ouro, com muito à-vontade, na maratona, no ano de 1988.

27 de agosto | 1990
Rosa Mota venceu pela terceira vez a Maratona no campeonato da Europa, ao superiorizar-se em Split, depois de o ter feito em Estugarda (em 31 de agosto de 1986) e em Roma (em 30 de agosto de 1987).

7 de agosto | 1994
Manuela Machado venceu a Maratona nos Europeus de atletismo de Helsínquia.

3 de agosto | 1996
Fernanda Ribeiro venceu os 10.000 metros nas olimpíadas de Atlanta, estabelecendo novo recorde olímpico.

5 de agosto | 1997
Carla Sacramento tornou-se campeã mundial dos 1500 metros, nos Europeus de atletismo.

22 de agosto | 2004
Vinha aí o tempo dos atletas portugueses naturalizados. Em 2000, em Sidney, Fernanda Ribeiro regressou ao bronze na légua, enquanto Nuno Delgado também o obteve, no judo, modalidade que começava a impor-se. Quatro anos depois, Francis Obikwelu (nigeriano naturalizado português) ganhou a medalha de prata nos cem metros em atletismo, nos Jogos Olímpicos de Atenas, depois de ter sido campeão mundial em Gotemburgo, em 2002, correndo a distância em menos de dez segundos (9,99 mais rigorosamente). Nesses jogos, Sérgio Paulinho venceu uma medalha para o ciclismo (bronze), totalmente inesperada, e Rui Silva também “bronzeava” nos 1.500 metros de atletismo.

8 de agosto | 2005
António Pinto venceu os 10.000 metros de atletismo, no Europeu, em Budapest.

18 de agosto | 2008
Vanessa Fernandes foi medalha de prata no triatlo dos Jogos Olímpicos de Pequim

21 de agosto | 2008
Nélson Évora vence a medalha de ouro olímpica no triplo-salto, em atletismo, nos Jogos Olímpicos de Pequim.

8 de agosto | 2012
Fernando Pimenta e Emanuel Silva venceram a medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Londres, em canoagem (K2, 1.000 metros). Em 2016, nas Olimpíadas do Rio de Janeiro, Telma Monteiro deu nova medalha (de bronze) ao judo português. Em 2020, Portugal obteve quatro medalhas nos jogos de Tóquio, conquanto não no mês de agosto. Fernando Pimenta (canoagem – K1 – 1.000 metros) obteve bronze, Jorge Fonseca venceu a medalha de bronze no judo. Patrícia Mamona obteve prata no triplo salto feminino e Pedro Pichardo, cubano naturalizado português, venceu o triplo-salto masculino, repetindo o que Nélson Évora tinha feito, em Pequim, em 2008.

30 de agosto | 2019
Jorge Fonseca conquistou o primeiro título mundial de um português, no judo.

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