Sábado, 20 de Abril de 2024
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Adérito Silveira
Adérito Silveira
Maestro do Coral da Cidade de Vila Real. Colunista n'A Voz de Trás-os-Montes

Caloteiros

Em 1919, havia um padre de nome Osório que, num dia de primavera, foi abordado por um homem galante e refinado palrador.

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Ao cruzar-se com o padre pediu-lhe vinte 10 reis emprestados.

O padre, conhecedor destes pelintras bem vestidos respondeu-lhe:

– Dez mil reis? Dou-te cinco porque assim ganhamos os dois: tu ganhas cinco e eu ganho outro tanto.

Na verdade, o padre Osório estava bem vacinado para este tipo de parasitas, pessoas que gostam de impressionar mas à custa dos incautos e pacóvios. A técnica destas pessoas é variada e imprevisível como se de um ataque de guerra se tratasse.

O mesmo caloteiro foi a casa de um homem rico pedir emprestado dez mil reis, ao que recebeu prontamente a resposta:

-Oh! Que pena, a minha sogra está muito mal e precisa de cuidados e medicamentos. Vens em hora má.

É sabido que o caloteiro da cidade é mais sabido do que o da aldeia. Este, ao lado do outro até parece um anjo de asas brancas, um puro de coração, uma pessoa honrada.

É certo que um rico não se deixa sangrar facilmente, enganá-lo é difícil: é como achar agulha em palheiro.

Caloteiro, normalmente não gosta de trabalhar, gosta sim do alheio. Gosta da vida airada, gosta de gastar mais do que o que ganha, diverte-se em folias acima das possibilidades. O caloteiro normalmente é homem de expedientes, parasita por excelência, minucioso, crava como carraça em cão de pobre.

A arte de cravar o próximo presta-se a histórias bem cómicas de fazer rir até uma velhinha acamada e quase defunta, normalmente, o artista usa da adulação como mola real desta espécie de negócio burlão.

O terreno prepara-se com tempo, que linda vai a senhora, que plumagem leva, que sabedoria, que graça no andar, que sorriso, que fina cintura.”

Então como resistir a tão eloquentes piropos? Como ignorar pessoas tão bem falantes, amáveis, polidas, de luva branca com quem se trocam tão cerimoniosos cumprimentos?
Um dia, no largo das viúvas ricas, um homem abastado é chamado de parte por um sujeito, bem arreado, insuspeito na sua honorabilidade, palrador emérito, mas sempre encalacrado e nervoso pelas dívidas acumuladas. Ele precisava de 50 paus, quanto antes para pagar a uma galdéria que o tinha enganado na noite de S. Pedro, colhido de surpresa explicou-se: “ Olhe homem de Deus, não ouviu dizer que amanhã vai rebentar para estes lados uma revolução de fazer o sangue correr pelas ruas e que quase ninguém vai escapar?”, “– É mais que certo que o senhor pode morrer, e depois? – dispara ele de rebentina- e olhe que uma bala já eu apanhei agora com a sua ousadia”.

Na verdade, o caloteiro não vai desaparecer. Ele pertence à ordem social do planeta que se pode gabar que, em cada esquina, há um vigarista com a inefável esperteza de aldrabar.

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