A semana de 7 a 14 de Outubro é a chamada «semana da educação cristã», dedicada a despertar a atenção para a enorme tarefa de educar cristamente, cujos destinatários principais são as crianças, os adolescentes e jovens, e os agentes directos os pais e os professores. Em cada ano a Igreja destaca um problema, uma situação que exija especial atenção dos educandos e dos educadores, e, para além de chamar a atenção para esse problema, procura fornecer auxílios para o desempenho dessa missão. Neste ano, a respectiva «Comissão Episcopal da Educação Cristã» destaca a influência dos «media» ou meios de comunicação social em toda a tarefa educativa.
Por «media» entende-se aqui toda a variedade de tecnologia de comunicação humana, os computadores e o recurso à Internet, sem esquecer os rádios, os auscultadores, as televisões e telemóveis, os novos discos ou CD (discos compactos), DVD, e respectivos aparelhos de reprodução sonora.
Uma primeira constatação é que os jovens sabem mais disto que os adultos, os filhos mais que os pais, e os netos muito mais que os avós. Os adultos chegam a sentir-se inferiorizados perante as novas gerações e, por momentos, nem sabem o que hão-de dizer nem fazer, e a tentação é deixar andar. De uma coisa, porém, depressa se apercebem: que tudo isso custa caro, depressa avaria e depressa envelhece, que distrai e que, frequentemente, o uso sistemático desses meios tem uma dose de exibicionismo e desejo de afirmação. Aí está uma primeira atitude adulta – ajudar os novos a tomarem consciência desse risco.
De qualquer modo, há que reconhecer que esses meios são uma realidade nova que não podemos ignorar, quer pela sua utilidade, quer por constituir um novo modo de conhecimento e de passatempo. Como aconteceu há décadas com a imprensa e os jornais, com os telefones, a rádio e a televisão e suas modalidades, a nova tecnologia da informática e Internet é um instrumento com duas faces, e é preciso aprender a fazer bom uso dele. Uma dessas faces é a universalidade de relações que daí podem nascer. Assim como deixar ir os filhos para a rua e para a escola acaba sempre por gerar relações de amizades fora dos laços familiares, as novas tecnologias alargam imensamente esses contactos com outras pessoas, de perto e de longe, conhecidas e desconhecidas. O espírito de aventura dos novos e o seu natural optimismo torna-os presa fácil dos aventureiros da Net, dos seus variados namoros. É por isso um erro grave deixar os filhos entregues a eles mesmos com a televisão aberta e a possibilidade de navegação na Net. Pode ser uma nova forma de vadiagem.
Esses novos contactos e os inúmeros passatempos que a nova tecnologia proporciona fazem-se, porém, sem sair de casa, permanecendo as pessoas sentadas e isoladas no seu quarto. Daí nasce uma nova forma de isolamento, de perda do espírito de grupo, de falta de exercício físico geradora de obesidade, de ausência de oralidade, o que acarreta danos multiplicados.
Há uma terceira verificação mais subtil: a nova tecnologia não se limita a transmitir conhecimentos, a ser veículo, como os canais domésticos conduzem a água em nossas casas. A nova tecnologia altera os conteúdos, dá-lhes uma nova forma, quase os fabrica de novo, desenvolve uma sensibilidade própria: sublinha a imagem visual e auditivo, a sensação e o espectáculo, desenvolve o apetite pelo momentâneo e o parcelar, mas descuida o lógico e o racional, a reflexão e a interdisciplinaridade, o sentido da totalidade. Pela sua beleza, surpresa e aspectos lúdicos, as novas tecnologias exercem especial sedução, os seus produtos impõem-se depressa, dão informações rápidas, mas favorecem uma certa preguiça mental e a mera erudição, constroem uma certa prisão. As atitudes adultas do saber ultrapassam o mecanismo das novas tecnologias. Numa palavra, elas constituem um bom auxiliar da reflexão, fornecem elementos abundantes, mas a reflexão adulta é outra coisa. Deste modo, a nova tecnologia não substitui os modos clássicos de conhecimento tais como a leitura pessoal do livro e do jornal, o longo diálogo com as pessoas reais, a investigação pessoal. Há meses escutei na rádio o desabafo de uma mãe aflita com o percurso académico de uma filha dizendo ser aluna brilhante em conhecimentos de Física, de Química, de Biologia, até em datas históricas, mas quando se passava para a Língua Portuguesa, a Literatura, a síntese histórica e expressão escrita e oral, era um fracasso. Valia a pena perguntar-lhe se não seria uma aluna viciada no computador onde tudo é comprado em pacotes e monossílabos.
No aspecto religioso há um risco especial nas novas tecnologias: colocam-nos em contacto com um vastíssimo mundo de informações e com uma multiplicidade de desabafos pessoais, mas esses contactos feitos pela Net são realidades sem controlo, sem referência, quase sem rosto, pessoas chamadas «virtuais». Que valor objectivo têm essas informações e aqueles desabafos? E, pior ainda, afastam-nos da participação directa na vida da comunidade real, um elemento fundamental na vida religiosa que não é feita de «informações» mas da participação da pessoa real em assembleias reais.
Os adultos que conhecem os media saberão dialogar com os jovens; os que não sabem oiçam-nos e comparem o que eles dizem com a vida real. O alheamento é que será sempre negativo.
* Bispo de Vila Real