Regresso às aulas sem ir à escola
Martim Pimentel tem 8 anos e frequenta o 2º ano na Escola EB1 nº 1 do Santo Amaro, em Chaves. Diz ele que ter aulas na escola ou em casa “é igual”, a única diferença é que “não estou ao pé dos meus colegas”.
No primeiro dia de “aulas” do 3º período, Martim começou por fazer “uma ficha de matemática” da parte da manhã e a tarde foi dedicada ao português com “a leitura de um texto e a escrita de algumas frases com palavras do mesmo texto”.
Apesar desta nova realidade a que a comunidade educativa teve que se adaptar devido à pandemia, a rotina de Martim pouco ou nada se alterou em casa. “Através de email, a professora envia de manhã um plano de estudos diário com todos os anexos necessários, ou seja, com as indicações das páginas dos manuais que são para usar ou com as indicações das atividades que estão disponíveis na Escola Virtual”, explicou Vítor Pimentel, o pai e encarregado de educação, que também está a trabalhar a partir de casa juntamente com a mãe de Martim, professora numa escola de Bragança.
Neste arranque do 3º e último período, a escola de Martim manteve a mesma estratégia que adotou nas últimas duas semanas do anterior, embora esteja em cima da mesa a realização de aulas síncronas. “Essa porta ainda está aberta, mas aquilo que me pareceu é que vão ficar à espera que inicie a “telescola” para perceber se depois há necessidade ou não fazer aulas síncronas”, referiu o pai, que se vê “numa realidade nova” e que, apesar de o tempo de atenção para com o filho ter dobrado, com o facto de estar em casa, não é perdido. “Estamos a garantir que ele tenha o melhor acompanhamento possível dentro desta conjuntura que estamos a viver para que possa transitar para o 3º ano”.
Vítor Pimentel acredita que, eventualmente, o ensino à distância poderá deixar algumas lacunas na aprendizagem dos alunos, mas a sua maior preocupação é a desigualdade que vai criar. “No meu caso, não estou preocupado com alguma lacuna que o Martim possa vir a ter, porque, para além de reconhecer competências na professora dele, temos, felizmente, condições em casa que lhe permitem acompanhar as aulas quase como se estivesse na escola. O Martim tem um portátil só para ele com acesso à internet e os pais disponíveis para o ajudar, mas há alunos que não as têm e vão sair prejudicados em relação aos outros”.
Martim diz ter já saudades dos colegas e da professora, e no regresso à escola quer abraçá-los um a um e “fazer a minha festa de anos”, uma vez que celebrou o seu 8º aniversário durante esta pandemia.
Alto Tâmega o arranque do 3º período
Um pouco por toda a região, as aulas do 3º período “arrancaram dentro da normalidade” mediante as circunstâncias que se vivem em tempos de pandemia.
Em Valpaços, os alunos de todos os níveis de ensino, inclusive o pré-escolar, “regressaram à escola em casa” através da plataforma Teams, que já era utilizada anteriormente. “Demos formação a todos os professores de todos os níveis de ensino e criaram-se emails institucionais para garantir a segurança”, referiu Alexandra Doutel, diretora do Agrupamento de Escolas de Valpaços.
Em Vila Pouca de Aguiar, a plataforma escolhida foi a Google Classroom, onde no primeiro dia de aulas, todos os alunos do secundário, participaram em todas as aulas lecionadas e, segundo o diretor do Agrupamento, José Rodrigues Teixeira, “o feedback é positivo”. “Do 2º ciclo até ao secundário, as aulas já estão a decorrer, no que diz respeito ao 1º ciclo, e uma vez que é mais complicado à medida que a faixa etária diminui, as medidas ainda estão a ser implementadas”.
Em Ribeira de Pena, a utilização de plataformas não foi novidade para a comunidade educativa e o arranque das aulas decorreu como previsto. No próximo dia 20, as atividades vão ser complementadas com a emissão do Estudo em Casa, na RTP Memória. “Terão aulas síncronas e a partir do dia 20 de abril vamos reformular os horários para termos os alunos a assistir às aulas através da TV, mas não vamos abdicar da presença dos professores”.
Já no Agrupamento de Escolas Gomes Monteiro em Boticas, apesar de aulas já terem arrancado, o plano de ensino à distância ainda não está definido, uma vez que “vai iniciar tudo na próxima segunda-feira com o Estudo em Casa”. “Para não haver mudanças consecutivas, vamos iniciar tudo no dia 20 de abril. Todas as atividades serão colocadas numa plataforma que serão complementadas pelas aulas da TV”, referiu Ana Luísa Monteiro, sub-diretora do agrupamento, onde os serviços de psicologia “elaboraram uma planificação para os alunos do 1º ciclo que foi enviado para os encarregados de educação com um horário semanal”.
A desigualdade e a falta de equipamentos e acesso às tecnologias são preocupações transversais aos diretores dos agrupamentos do território, mas em parcerias com as respetivas autarquias e juntas de freguesia, as escolas estão a garantir que o ensino chegue a todos os alunos. “Entramos em contacto com as juntas de freguesia, assim como com cafés e associações locais e, mediante os horários dos alunos, vão abrir as suas portas para que, em segurança, os alunos possam assistir às aulas e ter acesso à internet”, referiu Alexandre Doutel, de Valpaços, onde serão privilegiados os alunos do secundário, cursos profissionais e com necessidades especiais educativas.
“Isto já é um processo que acelera a desigualdade, se optarmos só por um método é muito complicado, porque não chegamos a todos os alunos”, anuiu Ana Luísa Monteiro, do agrupamento de Ribeira de Pena.
Alunos já “estão fartos” de estar em casa
Em Vila Real, os alunos mostraram-se “familiarizados” com as aplicações usadas no ensino à distância, apesar de preferirem ter aulas na escola. No entanto, como ainda não é possível, devido à covid-19, tentam manter o ritmo depois das férias da Páscoa.
Na aldeia de Paredes, Guilherme, de 17 anos, e Irene, de 13, contaram à VTM como foi este “regresso à escola”, onde tudo correu dentro do esperado, pois já estavam adaptamos desde o final do segundo período.
Guilherme Mesquita frequenta o 11º ano no Liceu Camilo Castelo Branco e gostava de ser engenheiro, mas para isso ainda tem de estudar muito. No entanto, os computadores fazem parte do seu quotidiano e ter aulas nas plataformas digitais não é um problema. “Tem corrido bem, mas é diferente estar na sala de aula, onde temos de mostrar maior atenção ao que o professor diz. Em casa distraiu-me com mais facilidade e não somos tão controlados”, refere, adiantando que já tem saudades de estar com os colegas. “Da escola sinto falta dos amigos, do convívio, mas espero ainda regressar este ano letivo. Vamos ver o que acontece”.
A irmã mais nova, Irene frequenta a mesma escola, mas no início teve mais dificuldades, que foram ultrapassadas com a ajuda da mãe. “Já estou farta de estar em casa. Tenho saudades de estar com as minhas amigas, mas dos professores não tenho muito”, diz entre risos Irene, que está ansiosa para regressar à escola, o que só deverá acontecer no próximo ano letivo.
Na segunda-feira, Irene terá uma nova experiência através da RTP. “Estou tranquila para ver como vai funcionar, mas acho que estou mais atenta nas aulas através do computador do que na escola, onde me distraio com facilidade”.
Até agora, um dos maiores entraves é a velocidade da internet, que nem sempre corresponde ao desejo das famílias, sobretudo quando há uma sobrecarga grande na rede. “Ainda não temos fibra e isso torna o computador lento e é aborrecido estar à espera que abra uma página, por exemplo”.
A mãe, Almerinda Coutinho, acredita que este tipo de ensino não é o ideal, mas até “tem corrido bem”. No entanto, refere que se os filhos fossem mais pequenos teria de lhe dar mais atenção. “Alguns pais sentem mais dificuldades em lidar com esta situação nova para todos, mas nós já estamos bem adaptados, mas este tipo de ensino jamais poderá substituir a escola presencial”.
Acrescenta que a escola “é insubstituível”, pois há mais exigência, além do convívio, da rotina, da prática, que as novas tecnologias não conseguem substituir.
“ESTÁ A SER TUDO UM POUCO CONFUSO”
O terceiro período arrancou na terça-feira. Um regresso às aulas diferente do habitual uma vez que o ensino será à distância devido à pandemia de covid-19.
Martim tem 11 anos e frequenta o 6º ano na escola Luciano Cordeiro, em Mirandela. É aluno de 5, gosta de jogar futebol e sonha um dia ser médico. Ao longo do último mês esteve em casa, após o fecho das escolas. Depois de enviados os últimos trabalhos do segundo período, a playstation ocupou o lugar dos livros, mas agora é tempo de regressar ao estudo. O arranque do terceiro período, diz, “correu bem. A professora de matemática mandou exercícios para fazer e eu fiz”.
Ter aulas online não é problema para este jovem mirandelense, mas “tenho saudades da escola e de estar com os meus amigos. E na escola é mais fácil tirar dúvidas sobre a matéria”.
Para a mãe, Sónia Mendonça, o arranque deste período letivo foi “confuso”. “Recebemos um email da diretora de turma, na semana passada, a dizer que ainda não sabia muito bem o que se ia passar no agrupamento”, ou seja, “os próprios professores estão à nora”.
Engenheira Civil de profissão, Sónia confessa que “em Matemática, por exemplo, há muita matéria nova, diferente daquela que se aprendia há uns anos. Eu, por acaso, vou conseguindo ajudar o Martim, mas tenho que estudar primeiro para lhe conseguir explicar”.
Mas nem todos têm a sorte do Martim “e não sei como muitos pais vão fazer”, confessa esta mãe acrescentando que “se não forem os pais a obrigá-los, muitos alunos não vão ter a iniciativa de estudar, ainda para mais nestas circunstâncias”. Quanto à avaliação, também ainda nada foi esclarecido. A única coisa que se sabe é que “será contínua e que vão ter em conta o primeiro e segundo período, e não tanto o terceiro”.
Sónia tem-se revezado com o marido, Ricardo, até porque têm outra filha, Adriana, que frequenta o pré-escolar “e não há perspetivas para quando possa regressar à escola. Com ela está a ser mais complicado”.
Por agora, resta arregaçar as mangas e pôr mãos ao trabalho. As aulas começam, de acordo com um email enviado pelo agrupamento de escolas, na próxima segunda-feira, através da plataforma ‘Zoom’. Até lá, os pais e encarregados de educação terão tempo para tratar das questões técnicas, como adquirir um computador, caso não tenham, providenciar o acesso à internet e instalar o programa para que as aulas decorram da melhor forma possível.