Procurei explicar que a democracia também tem os seus rituais. É preciso manter a chama, como atalhou um amigo comum que presenciava a troca de opiniões. Já desempenhará uma missão positiva, se assim for, aliás, como a descida da Av. da Liberdade. Aquela porque permite as leituras plurais que os partidos políticos fazem do momento que se vive, sempre diferente, porque diferentes são também as circunstâncias que envolvem cada comemoração; esta porque assinala a abrangência que em 1974 se conseguiu, pese embora as forças centrífugas que pareciam destruir a democracia titubeante que dava os primeiros passos. Hoje, quem congrega os esforços que então se exprimiam a partir do Movimento das Forças Armadas é a Associação 25 de Abril, assumindo essa tarefa aglutinadora.
Aliás, numa análise mais cuidada aos discursos que foram passando no hemiciclo de São Bento, há leituras bem interessantes do momento atual que, enquanto cidadãos portugueses, cidadãos da União Europeia, vivemos. Depois, o Presidente da República – há quem esteja sempre à espera de recados à esquerda e à direita – quis dar alguns sinais, chamando a atenção para temas bem atuais e de evidente relevância. Em ano de eleições autárquicas, referiu-se ao “poder local incansável” e lembrou, mais uma vez, que o poder local é o “fusível de segurança singular da nossa democracia”, mesmo que com “problemas e defeitos, como toda a obra humana”. Tenho para mim que ao trazer este tema ao 25 de Abril deste ano, o Presidente valoriza o papel das autarquias e dos autarcas na tarefa de servir os cidadãos no mais comezinho, mas também na satisfação das necessidades e resolução dos anseios que mostram, em cada momento, que governar é resolver problemas, é encontrar soluções para o bem-estar de todos. Como seria bom se todos os eleitos o ouvissem!
Mas se aquele amigo que considerou os rituais do 25 de Abril entediantes e repetitivos tivesse tido a oportunidade de conversar com crianças filhas de pais que nasceram depois de Abril de setenta e quatro e percebesse a curiosidade em conhecer pormenores dos acontecimentos que outros mais velhos lhe dizem terem sido importantes, fundamentais para o nosso viver coletivo de hoje, mudaria, talvez, esse sentimento.
Fui convidado pela quarta vez para partilhar a minha vivência do Abril de 1974 com alunos do 4º ano do Centro Escolar das Árvores. Nunca saí daquela “aula” desiludido. Pelo contrário. A curiosidade, o querer saber pormenores relativos aos tempos de então, as diferenças de hoje para esse tempo, tudo podia ser perguntado e respondido. Afinal, porque foi Abril que que nos trouxe a possibilidade de exercitar a cidadania, desde logo, pensando e exprimindo o que se pensa.