Como cardeais, vieram a Fátima, de 9 a 15 de Maio de 1956 e passando por Coimbra, o cardeal Roncalli, patriarca de Veneza e mais tarde eleito Papa João XXIII; o seu sucessor em Veneza, cardeal Albino Luciani, em 10 de Julho de 1977 e que seria mais tarde o Papa João Paulo I; e o cardeal José Ratzinger, em 13 de Outubro de 1996, que também passou por Coimbra, que voltaria a Portugal em Março de 2001 visitando o Porto, Gaia, Braga e Guimarães, e que é agora Bento XVI.
2 – Esta ligação de Fátima ao Papa vem do início das aparições de 1917. Nas suas «Memórias», a Lúcia conta que, após a aparição de Maio de 1917, dois sacerdotes foram visitar os Pastorinhos e lhes recomendaram que rezassem pelo Santo Padre. Desde então, a Jacinta manifestou especial afecto ao Papa desabafando frequentemente: «Quem me dera ver o Santo Padre! Vem cá tanta gente e o Santo Padre nunca cá vem».
Diz ainda a Lúcia que, andando a brincar com os dois primos junto do poço do quintal de sua casa, a Jacinta lhe dissera: «Não vistes o Santo Padre? Não sei como foi! Eu vi o Santo Padre em uma casa muito grande, de joelhos, diante de uma mesa, com as mãos na cara, a chorar. Fora da casa estava muita gente e uns atiravam-lhe pedras, outros rogavam-lhe pragas e diziam-lhe muitas palavras feias. Coitadinho do Santo Padre! Temos de pedir muito por ele».
Mais tarde, na loca do Cabeço, a Jacinta, após as orações do Anjo, chama pela Lúcia e diz-lhe: «Não viste tanta estrada, tantos caminhos e campos cheios de gente, a chorar com fome, e o Santo Padre em uma igreja diante do Coração Imaculado de Maria a rezar?».
Os estudiosos afirmam haver aí uma antevisão da II Grande Guerra e suas consequências, tudo relacionado com a 3ª parte do Segredo que os Pastorinhos haviam recebido em Julho de 1917. Esse «segredo» foi passado a escrito pela Lúcia em 1944, guardado no Vaticano e revelado no ano 2000, por ordem do Papa João Paulo II. (Os Papas anteriores haviam aberto o subscrito mas mandaram-no fechar novamente).
Desse texto do «segredo» consta a visão de «Um Bispo vestido de branco, vários outros bispos e sacerdotes, religiosos e religiosas a subir uma escabrosa montanha, no cimo da qual estava uma Cruz de troncos toscos como se fora de sobreiro com casca. O Santo Padre, antes de chegar, atravessou uma grande cidade meia em ruínas, meio trémulo e com andar vacilante, acabrunhado pela dor e pena, orando pelas almas dos cadáveres que encontrava pelo caminho; chegado ao cimo do monte, prostrado de joelhos aos pés da grande Cruz, foi morto por um grupo de soldados que lhe dispararam vários tiros e setas, e assim mesmo foram morrendo, uns atrás dos outros, os bispos e sacerdotes, religiosos e religiosas e várias pessoas seculares, cavalheiros e senhoras de várias classes e posições».
A leitura teológica desse texto foi confiada pelo Papa João Paulo II ao cardeal Ratzinger, então prefeito da Congregação da Doutrina da Fé, leitura que foi publicada em 2000 e que o cardeal Sodano, Secretário de Estado de João Paulo II, resumiu em Fátima ao 13 de Maio de 2000, no final da Missa celebrada pelo próprio João Paulo II.
Deste modo, Fátima está ligada ao Papa, com relevo para João Paulo II, o «Bispo mártir» referido no texto do «segredo», e Bento XVI, o estudioso do mesmo.
13 – Convém recordar neste aspecto que não foi a Igreja que inventou Fátima, mas que foi Fátima que se impôs à Igreja. No início, a Igreja, através do bispo local, dos outros bispos e dos vários Papas, distanciou-se das Aparições, até que elas provaram ser dignas de crédito.
Essa atitude prudencial da Igreja é a atitude habitual. A Igreja como instituição tem pedras fundamentais lançadas por Jesus e é por elas que a Igreja se governa: o Papa sucessor de Pedro, os Bispos em comunhão com ele, a Bíblia lida em comunhão com a Igreja oficial, os sacramentos e os actos de culto celebrados de harmonia com a autoridade da Igreja, a evangelização do mundo segundo critérios fornecidos pela autoridade da Igreja. São as aparições que têm de provar que são verdadeiras, que nelas anda a voz de Deus e que não são meras fantasias espirituais. Foi assim em Lurdes, é assim em Fátima, e será sempre assim. É exemplar a atitude de reserva da mãe de Lúcia, saudavelmente reticente perante a afirmação da filha e dos dois primos.
As revelações particulares são ajudas preciosas que recordam oportunamente verdades evangélicas mas esquecidas. As verdades, esquecidas em 1917 e insistentemente recordadas nas Aparições de Fátima, são as verdades essenciais da vida humana: a relação do mundo com Deus, o sentido da eternidade, a conversão, a oração e a penitência, exactamente aquilo que Bento XVI vem a ensinar há anos como teólogo e como Pastor.
Neste dia 13 de Maio de 2010, Bento XVI está em Fátima, não como um turista ou um académico, mas como alguém que vive a mensagem e a experimenta como um perseguido a quem atiram «pedras», a quem rogam «pragas» e dizem palavras «feias». Ele não se admira que isso aconteça. O que o preocupa a ele, e deve preocupar a nós, é que o mundo continue a julgar que são fantasias de crianças, porque podemos pagar caro essa teimosia.