Deste modo, Jesus tornou-se causa e modelo do homem novo, o homem planeado por Deus. A Páscoa de Jesus dá origem ao verdadeiro humanismo, tornando-nos capazes de, com Ele, vencer as contrariedades da vida e a própria morte, e atingir a plenitude de todas as faculdades humanas e não somente do fugaz domínio da técnica. «Eis o Homem».
Diz-se que a riqueza da Páscoa se percebe melhor no ambiente rural. Talvez porque a vida do campo faça sentir mais depressa que a renovação da terra não depende somente do esforço do homem, e por essa experiência somos facilmente transportados para o mistério da Páscoa como renovação pessoal nascida da força e do amor de Deus. Pelo contrário, o homem urbano vive diariamente deslumbrado pelos êxitos da sua técnica, sendo-lhe mais difícil sair do fumo desses triunfos, afigurando-se-lhe que é senhor do mundo e que a Páscoa é uma fantasia. Também por isso o anúncio da Páscoa é especialmente necessário no clima urbano.
2 – No tempo de S. Paulo a Páscoa não era uma festa anual, mas um facto e uma pessoa que enchiam a vida de todos os dias. A celebração semanal na noite do sábado para o Domingo colocava em relevo o sentido da pertença a uma comunidade. Agora que temos a festa de um Domingo especial, convém não esquecer que a Páscoa é maior que essa festa anual.
Como de um sol brilhante, da Páscoa nascem a clarificação da Bíblia, a força do Domingo como primeiro dia a abrir a semana, a dignidade do corpo, da sexualidade, a densidade da vida Consagrada e do Celibato, a esperança dos Defuntos, o sentido das colectas em favor dos pobres, o encanto do Crucifixo, a coragem para aceitar contrariedades, riscos e fracassos e os Sacramentos da Igreja como gestos de Jesus na vida dos homens: a enxertia do Baptismo, a força do Crisma, a união da Eucaristia, o perdão pacificador da Confissão, o ministério dos Pastores, a beleza do Matrimónio, o conforto da Santa Unção, o sentido da viuvez.
Para a vida do mundo nasce da Páscoa uma subtil torrente de esperança e de alegria, diferente da esperança sociológica e do optimismo psicológico, mera afirmação repetida de que tudo irá correr bem no futuro próximo e realizar-se o sonho do bem-estar. A esperança pascal ultrapassa esse aceno de simpatia humana. Tem algo de imponderável, de fogo e de paz, e conduz-nos a outro horizonte: a certeza de que a vida tem um sentido oculto, de que venceremos as contrariedades e a morte, sem nunca excluir o realismo e a austeridade da conduta pessoal e da transformação económica e política, social e cultural, da sociedade.
3 – Jesus ressuscitado quis conservar no seu corpo as cicatrizes da cruz. A ressurreição é inseparável da cruz. Sem a cruz não haveria Páscoa verdadeira, mas um sonho de vida fácil, o prazer sem dever, a consolação sem missão, casamento sem filhos, filhos sem escola, escola sem catequese, catequese sem missa, e missa sem amor. Por sua vez, sem a ressurreição a vida ficaria imatura, perdida na cinza da terra, e tudo seria mais frio, mais invernoso e mecanizado. O nosso tempo, a nossa cultura, as nossas escolas, as nossas estruturas humanas, as nossas famílias, têm um déficit pascal. Nem o amor humano aquece. O próprio culto cristão ameaça ser rotineiro e racionalizado, formatado.
Aos pais, párocos, catequistas, professores e demais educadores desejo coloquem Jesus ressuscitado no centro da vida, como fez Paulo de Tarso, e a alegria pascal reflectir-se-á na vida de cada um e na sociedade.
Para todos os cristãos e residentes na Diocese, os votos de Santa Páscoa.