Com restaurantes, cafés e lojas fechados, supermercados limitados, espaços de enoturismo sem clientes, importações praticamente fechadas, os produtores de vinho do Douro tentam encontrar soluções para uma crise que terá repercussões inimagináveis na região demarcada mais antiga do mundo.
Depois de um ano “muito bom”, o atual cenário é adverso e as previsões não são nada animadoras, não só pela quebra que já se sente no mercado nacional, mas também no exterior, que no ano passado bateu um novo recorde nas exportações. Para evitar o colapso, os produtores estão a recorrer a novas ferramentas, como a aposta em plataformas digitais, disponibilização do produto junto dos pequenos negócios, de forma a dinamizar o setor do vinho, que vive momentos de grande incerteza.
Ainda sem sentirem os verdadeiros impactos do Brexit nas exportações, o Douro tem pela frente um enorme desafio, que será ultrapassar uma quebra de vendas que poderá bater todos os recordes negativos.
Em Sabrosa, Olga Martins, da Lavradores de Feitoria, revela que estão a tentar “manter a normalidade possível”, num setor em que “está a sofrer imenso”, com os mercados europeus praticamente parados. “O único mercado está a funcionar bem é a Noruega, que teve uma reação um pouco diferente dos outros países, com os consumidores a comprar vinho, nestes dias de confinamento”, refere, adiantando que as exportações para este país nórdico vão crescer entre 10 a 15 por cento.
Já a nível nacional, o mercado “está completamente parado”, por isso a Lavradores de Feitoria aposta nas vendas online. “É o que está a mexer alguma coisa e depois temos uma estratégia de apoio ao pequeno comércio, em que os vinhos estão disponíveis no nosso distribuidor e numa plataforma online”, explica, acrescentando que estão a fazer descontos especiais para ajudar os pequenos comerciantes, que lutam pela sobrevivência. “Não podemos pensar só nos grandes clientes, temos de ajudar também os pequenos, para dinamizar a economia, que pode criar aqui um efeito dominó positivo. Queremos tentar ajudar a uma escala local, regional, para depois chegarmos ao nacional”.
Apesar das quebras, Olga Martins nem quer ouvir falar em layoff. “Nós continuamos a trabalhar, com algumas pessoas em teletrabalho (comerciais e administrativos), em que tentamos ser mais eficientes, mantendo todos os cuidados para satisfazer algumas encomendas que ainda existem. São poucos os mercados que funcionam, mas temos de garantir que esses mercados são bem servidos”.
VENDAS ONLINE
Uma loja online é uma das apostas da adega de Sabrosa para manter o negócio a funcionar, numa altura em que “está tudo parado”.
Celeste Marques, enóloga da adega, explicou à VTM que as vendas estão a ressentir-se muito com a pandemia e na próxima semana deverá estar a funcionar um site de venda dos diversos produtos da adega duriense. “Sentimos muitas quebras e vendemos sobretudo vinhos mais baratos”.
Para dinamizar as vendas, está a ser criado um site. “Foi uma forma de nos reinventarmos, para minimizar as perdas”, aponta, sublinhando que surgiram muitos cancelamentos de encomendas no mercado internacional, que representa 30 por cento das vendas da adega. “Continuamos a vender apenas para a Suíça. Brasil e Ásia são mercados fechados, entre outros”.
Celeste Marques afirma que a adega está em serviços mínimos, mas ainda tem a equipa a trabalhar, alguns a partir de casa, outros na instituição. “Em maio, ainda não sabemos se uma parte da equipa irá para layoff, uma vez que as quebras são significativas, que poderiam ser maiores se estivessem mais presentes na restauração, por exemplo”.
Sobre o futuro, a enóloga revela que vai ser muito importante saber o quantitativo de benefício da próxima vindima. “É muito importante para a produção que não se baixe muito o quantitativo, pois os lavradores dependem disso. Se houver muito vinho, temos de ter apoio para manter os preços, por isso a Federação Renovação Douro já escreveu à ministra da Agricultura”.
Já Olga Martins teme pelo futuro da região, em que as empresas que não conseguirem vender, terão de baixar o preço, que pode atingir preços abaixo do custo e isso cria uma enorme disfunção no mercado. “Todos os outros produtores são pressionados a acompanhar esses preços e eu tenho muito medo que isso aconteça, tal como aconteceu na crise de 2008, que quase destruiu a região”, frisa, lembrando que a imagem do Douro ficou “muito beliscada”. “Apareceram vinhos inacreditavelmente baixos por todo o mundo, o que fez com que os consumidores pensassem que o Douro era uma região de vinhos baratos. Depois, fazer todo o caminho para voltar a construir a imagem diferente, é muito difícil”.
Celeste Marques
Adega de Sabrosa
"É muito importante para a produção que não se baixe muito o quantitativo, pois os lavradores dependem disso”
Olga Martins
Lavradores de Feitoria
"São poucos os mercados que funcionam, mas temos de garantir que esses mercados são bem servidos”