A pandemia veio trazer novos desafios aos produtores transmontanos, que têm vindo a mostrar uma enorme capacidade de resiliência para dar a volta ao abrandamento da atividade económica, que se regista um pouco por todo o mundo.
Apesar das condicionantes,[/block] o trabalho nas vinhas ou nos olivais transmontanos não parou, mas as vendas têm sofrido um duro revés, com a contração da economia. No entanto, os empresários continuam a apostar nos seus projetos para aumentar a sua capacidade de produção e estarem prontos para oferecer ao mercado produtos diferenciados e de grande qualidade.
Em Murça, a VTM esteve à conversa com Paulo Pereira, que continua a investir na plantação de olival e de vinha, apesar das dificuldades provocadas pela Covid-19 nas vendas, sobretudo no azeite, devido ao encerramento das lojas onde tinha o produto à venda. No entanto, a pandemia também trouxe novas ideias e, em breve, irá lançar um site para divulgar os seus produtos, onde se destacam o azeite ‘Serra de Murça’ e os seus derivados.
“Fomos muito afetados no mercado gourmet, no azeite em garrafas de meio litro, sobretudo com a quebra do turismo, que se verificou um pouco por todo o lado, mas a nós afetou-nos nas nossas lojas do Porto, Braga, Viana do Castelo e Guimarães, onde temos o produto à venda. Tivemos quebras entre 80 ou 90%”, revela o produtor que, mesmo assim, não desistiu e continua a investir. “Fui à procura de clientes particulares e também consegui enviar azeite para fora do país, para França e Suíça”.
LIGAÇÃO AO CAMPO
Paulo Pereira conta que desde pequeno tem uma grande “afinidade” com o campo. “A minha família tinha algumas propriedades e sempre tive gosto pelas culturas do olival e da vinha, que já vem do tempo do meu avô. Mas identifico-me mais com o olival, embora a vinha tenha uma rentabilidade maior”.
Depois de ter tirado o curso de gestão na Universidade de Braga, Paulo Pereira abriu uma seguradora em Vila Real, que no início correu bem, mas a crise financeira de 2008 veio complicar as contas e levar este empresário a enveredar por outro caminho, tendo encontrado na agricultura a sua verdadeira vocação. “Em meio ano, fomos do 80 ao 8, com a banca a deixar de financiar o crédito à habitação e os seguros inerentes ao crédito baixarem consideravelmente. Não foi uma questão de opção, teve mesmo de ser, porque estávamos a ter prejuízos mensais incomportáveis. Foi aí que decidi regressar a Murça para apostar na vinha e no olival. E é aqui que sou feliz”.
Com cerca de cinco hectares de vinha e 25 de olival, nos últimos anos não tem parado de aumentar a área de produção, tanto na vila como na aldeia de Paredes. “Dentro de cinco anos, acredito que vou triplicar a produção”.
Durante o ano, emprega duas pessoas, mas nesta fase, em que há mais trabalho com as plantações, teve de reforçar o pessoal e contratou mais dois trabalhadores. “O meu irmão também ajuda, mas a mecanização é uma das nossas apostas, porque de outra forma não seria rentável”.
“Sei que há mercado para este tipo de produto, por isso não estou muito preocupado com esta minha aposta”
Paulo Pereira
Produtor de Murça
OTIMISMO NO FUTURO
Apesar da burocracia que existe para apoiar projetos, por parte do Estado, o empresário acredita que o mercado vai aceitar cada vez mais os seus produtos. “Sei que há mercado para este tipo de produto, porque tem qualidade premium. Portanto, não estou muito preocupado com esta minha aposta”.
Com uma produção anual na ordem dos cinco mil litros, acrescenta ainda que as expectativas futuras “são boas”. “O meu objetivo é satisfazer a procura que tenho dos meus clientes. Faço uma gestão apertada para os satisfazer bem. Aos pouquinhos, quero aumentar a carteira de clientes e tentar chegar a bons mercados, onde pagam pela excelência do produto”.
Em breve, irá trabalhar num novo projeto para o mercado gourmet suíço.
Já sobre o vinho, em mente está também o lançamento de uma marca nova no mercado. “As quantidades ainda não justificam o engarrafamento, mas em 2024 terei no mercado o meu vinho”.
Outra aposta já em marcha passa por uma agricultura sustentável. “Daqui a dois anos, todos os meus produtos serão biológicos e sei que têm muita aceitação no mercado externo. Obriga-me a trabalhar mais, contratar mais pessoal, menos produção, mas terei produtos livres de químicos e certificados que posso vender a um preço diferenciado”.
EM ALIJÓ
Sérgio Alves nasceu em Cabeda, no concelho de Alijó, há 38 anos. Filho, neto e bisneto de viticultores, o contacto com as vinhas começou cedo e é onde se sente como peixe na água. Apesar de ter enveredado pela engenharia civil, acabou por tirar um curso de jovem agricultor e em contacto com os enólogos, o “bichinho” cresceu e acabou por trocar a engenharia pela enologia. “Andei lá perdido durante três anos, mas não era a minha vocação, mas agora estou muito feliz com a opção que tomei”.
“Não tenho qualquer receio, pois estou confiante que este projeto irá dar frutos com o tempo”
Sérgio Alves
Produtor de Alijó
A pandemia veio condicionar a estratégia que tinha planeado, mas não alterou os planos do jovem empresário, que se prepara para lançar uma nova marca de vinho no mercado, um projeto que nasce na quinta do Rio Pequeno, entre as localidades de Cabeda e Sanradela. “É um projeto que pretende pôr na garrafa tudo aquilo que produzimos em uva. A minha intenção é encher tudo o que produzimos, incluindo as vinhas novas”.
Com cerca de 200 mil euros investidos tanto na plantação como na reestruturação de vinhas, Sérgio Alves revela que está a preparar o lançamento de uma nova marca no mercado. “Dentro de um mês e meio, acredito que teremos duas referências no mercado, um tinto de colheita 2019 e um tinto reserva também de 2019, da quinta do Rio Pequeno”.
Além disso, nesta primeira fase, o produtor também prepara um azeite da mesma quinta. “Será uma pequena quantidade, mas com muita qualidade, com extração a frio e com caraterísticas muito peculiares”.
Quando chegou a pandemia, o projeto da vinha já estava em andamento e decidiram não parar, mas tiveram de abrandar o ritmo, sobretudo com o lançamento de novos produtos. “Tivemos de esperar para passar esta fase mais crítica para poder lançar a marca, uma vez que era preciso fazer uma forte divulgação no canal Horeca”.
Há cerca de dois anos plantou quatro hectares de vinha em Sanradela e três em Francelos, que serão sobretudo para vinhos brancos, explorando no total cerca de 12 hectares de vinha.
DIFICULDADES
As restrições provocadas pela Covid-19 trouxeram dificuldades, não no trabalho na vinha, que tem decorrido dentro da normalidade, mas sim nos canais de divulgação do produto. “As coisas andam a um ritmo mais lento e o facto de não nos podermos deslocar trouxe dificuldades em divulgar o produto. Por isso, tivemos de esperar pelo desconfinamento para arrancar definitivamente com o projeto, que acredito que tem potencial para se afirmar no mercado, uma vez que terá castas misturadas, que vindimamos em conjunto, o que nos dá caraterísticas únicas”.
“DOURO TEM MUITO POTENCIAL”
Otimista por natureza, Sérgio Alves acredita que o Douro tem muito por onde crescer. “Está a afirmar-se no mercado, por isso não tenho qualquer receio, pois estou confiante que este projeto irá dar frutos com o tempo”.
Considera ainda que a marca Douro “é forte”, por isso quando a vacinação ajudar a estabilizar a pandemia e com o mercado a abrir na totalidade, as pessoas “vão continuar a consumir e não haverá problemas”.
Dentro de um mês, os primeiros vinhos da quinta serão lançados no mercado e haverá também um site para a venda online.
Sobre a internacionalização, o produtor quer dar “um passo de cada vez”. “Nesta primeira fase, vamos apostar só no mercado nacional, mas mais tarde queremos expandir para o mercado externo”.[/block]