“O trabalho que fizemos foi absolutamente desvalorizado” pelo secretário de Estado das Florestas e Desenvolvimento Rural, criticou Nuno Gonçalves, presidente da Câmara Municipal da Régua, que, em conjunto com outros autarcas da região que constituem a Comunidade Intermunicipal (CIM) Douro, apresentaram, no dia 18, fortes críticas ao facto de Daniel Campelo ter, alegadamente, rejeitado a proposta de limitar a produção de aguardente vínica à região demarcada.
Segundo o autarca, “a questão de fechar a produção de aguardente para o vinho do Porto é a base de um conjunto de alterações que vão catapultar o Douro para um crescimento económico, tirando-o desta crise que dura há dez anos”. “Ao contrário do que foi afirmado pelo senhor secretário de Estado, a proposta da CIM é claramente exequível e permitiria concentrar na região toda a mais-valia de produção de Aguardente Vínica. A ser aplicada, recolocaria no circuito comercial muitos vinhos que hoje são vendidos na economia paralela e contribuiria para quebrar a espiral de perda de rendimento a que os viticultores têm vindo a ser sujeitos desde o início do século”, garantem os autarcas.
Artur Cascarejo, autarca de Alijó e presidente da CIMDouro, sublinhou ainda que “num momento em que o país concentra os seus esforços no reequilíbrio da sua balança comercial, esta proposta tem perfeito e total enquadramento, pois reforça a componente de incorporação nacional no produto, substituindo importações de aguardente vínica no valor de várias dezenas de milhões de euros por aguardente de origem nacional”.
Numa conferência de imprensa onde marcaram ainda presença os autarcas de Sabrosa e São João da Pesqueira, foram lançadas fortes críticas à tomada de posição do secretário de Estado durante uma audição na Comissão de Agricultura e Mar da Assembleia da República, realizada na semana passada, onde foi apresentado um estudo (realizado segundo um desafio lançado pelo Governo) com “soluções concretas para a resolução dos problemas que atingem a região”, e no qual a questão das aguardentes vínicas é considerada como “base estrutural”.
Segundo os autarcas, Daniel Campelo baseia-se num “pretenso estudo científico elaborado por uma comissão derivada do Conselho Interprofissional (CI) que seria desfavorável à solução agora apresentada pela CIM”, no entanto, o mesmo documento, “para além de ser meramente técnico, e aliás bastante simplistas, não mereceu sequer, no que toca às suas conclusões, a concordância de todos os membros da comissão que o elaborou”.
Artur Cascarejo deixou claro que os autarcas “não estão a brincar” e adianta que a “entrega do documento foi apenas um primeiro passo”. “Não vamos ficar por aqui. Esta foi apenas a primeira de muitas outras iniciativas que vamos tomar nesta matéria. Vamos, a partir daqui, apresentar um conjunto de novas propostas concretas, para chamarmos a atenção para o problema e continuarmos a desenvolver os caminhos que consideramos necessários” para resgatar “a região da grave crise que há dez anos a esta parte tem assolado os pequenos e médios vitivinicultores”.
Segundo reação do secretário de Estado tornada pública, este “não tomou ainda posição sobre matéria, apenas evidenciou a existência de um relatório elaborado por um Grupo de Trabalho que foi constituído no âmbito do CI do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP)”, e que, concluído em 2011, revela a “inconveniência do fecho da região à importação/circulação de aguardentes vínicas”.
“A questão não está fechada e a posição do Governo é de acompanhar essa matéria sempre na esfera de intervenção do CI e do Conselho Diretivo do IVDP”, garantiu Daniel Campelo, salvaguardando que o relatório em causa “foi aprovado por unanimidade”, ao contrário do que defenderam os autarcas.
Casa do Douro mantém-se “fiel” às conclusões dos estudos feitos no CI e IVDP
“Nós mantemo-nos inequivocamente fiéis às conclusões dos estudos feitos no CI/IVDP, nomeadamente no que respeita à questão das aguardentes”, adiantou a direção da Casa do Douro, não assinando assim as críticas avançadas pelos autarcas da CIM.
Num comunicado divulgado no mesmo dia em que os autarcas vieram a público criticar o secretário de Estado, a Casa do Douro atesta que o referido relatório, que “foi aprovado por unanimidade”, foi “absolutamente desvirtuado por quem no Ministério da Agricultura ainda não entendeu que o poder da governação é sempre efémero e que só vale a pena ser exercido se for colocado ao serviço dos cidadãos, da equidade, da proteção dos mais débeis e de um desenvolvimento sustentado”.
Depois de “muitos responsáveis assobiarem para o lado como se não existissem problemas que atingem desde há quase duas décadas os vitivinicultores e ameaçam hoje arrastar para o abismo todo o setor”, surgiu “atualmente no Ministério da Agricultura um conjunto de personalidades que, passado mais de dez meses de governação, em que dizem ter ouvido muita gente, parece só ter captado quase em exclusivo as opiniões dos que são apologistas da política da terra queimada e do bota-abaixo, arredando quase sempre as posições dos legítimos responsáveis socioprofissionais e socioeconómicos do setor”, acusa a direção da Casa do Douro.
Ainda no comunicado, os mesmos responsáveis lamentam que “se encomendem, façam e desfaçam estudos com a facilidade de quem saboreia um belo rebuçado da Régua” e, apesar de recordar que a Casa do Douro tem defendido “há muitos anos a destilação de vinhos e a sua aplicação no vinho generoso”, lamentam que se tenha erigido “a destilação dos vinhos excedentes do Douro como meio, quase único, para resolver a crise dos viticultores quando é sabido que a realidade duriense é complexa e necessita de atuações firmes e muito bem estudadas”.