O choque impede que saibam contar com grandes pormenores a aventura. No entanto, Maria Elisa Martins, de 88 anos, que, com a irmã, Maria da Glória Pereira, de 85 anos, estiveram perdidas na freguesia de Mouçós durante dois dias e duas noites, recorda como tudo começou: com uma habitual caminhada ao início da tarde…
“Costumo ir andar, gosto de ir visitar as nossas matas”, relata a octogenária que, apesar de ter ficado à mercê do tempo inóspito, com temperaturas negativas, e sem comer durante 48 horas, apenas tem a lamentar, a nível físico, queimaduras nos dedos das mãos. Já a sua irmã, que teve ferimentos mais graves nos pés, provocados pelos tojos depois de ter perdido os chinelos que usava na altura, no dia 15 continuava internada no Hospital de Vila Real.
Segundo testemunhos na aldeia de Sanguinhedo, de onde as duas idosas são naturais, a caminhada começou por volta das 15h30 do dia 10 e o alerta foi dado pelo marido de Maria Elisa que, preocupado pelo facto de “ter caído a noite” a esposa não ter regressado a casa, entrou em contacto com a neta. “Duas noites e dois dias… Eu já não contava com ela”, desabafou Ernesto Botelho, de 85 anos.
Mas, a aventura das duas acabou bem, depois de várias horas de buscas, pela Guarda Nacional Republicana e populares, foram encontradas sentadas no chão e bem de saúde, apesar de desnorteadas e com alguns ferimentos ligeiros. “Não me lembro de nada. Lembro-me de ver muita gente e até fiquei assustada”, relatou, ao Nosso Jornal, Maria Elisa sobre o momento em que foi encontrada num terreno na zona de Ladares, a cerca de três quilómetros de distância da sua casa.
Se Maria Elisa e Maria da Glória não são capazes de contar exactamente como se perderam, o marido da irmã mais velha consegue descrever com pormenor o percurso que acredita que as idosas fizeram e o porquê de se terem desorientado. “Primeiro havia um caminho, agora a via rápida tapou-o e existem as giestas que estão muito altas”, revelou Ernesto Botelho, admitindo que também ele, que conhece aqueles terrenos como a palma das mãos, chegou a sentir-se um pouco desorientado na zona, tendo-lhe valido a capacidade de regressar “pelo caminho que tinha feito”.
Sem se lembrar de ter frio, fome ou medo, a verdade é que as duas octogenárias resistiram e contrariaram as expectativas dos familiares. “Foi uma alegria quando ouvimos alguém a berrar que as tinha encontrado e que estavam vivas. Parece um milagre”, recorda com um sorriso evidente nos lábios a neta, Mara Correia, revelando que as duas mulheres a reconheceram assim que a viram mas encontravam- -se “muito desorientadas e até delirantes”. “A primeira coisa que comeram em dois dias foi um chocolate Twix, uma barrinha para cada uma, e laranjas”, recorda ainda a neta, referindo que Maria Elisa não precisa agora de grandes cuidados médicos além do tratamento com cremes às mãos queimadas pelo frio e algumas vitaminas para recuperar a força.
Apesar de ter sobrevivido, Maria Elisa revela com alguma tristeza “que tem vergonha” do que aconteceu porque muitas pessoas “fazem pouco” das duas irmãs, garantindo mesmo que não vai voltar a fazer as longas caminhadas com a irmã, agora só na aldeia e acompanhada. “Chegou para o susto”, sublinhou.
Na operação de resgate das duas idosas estiveram envolvidas 30 militares da GNR, acompanhados por duas equipas cinotécnicas, e dezenas de populares.