No dia 11, foi transmitido, na Rádio Universidade, o primeiro de um conjunto de programas que vão poder ser, também, “testemunhados” através do Nosso Jornal. O desafio é levar aos nossos leitores algumas das ideias deixadas “no ar” pelos convidados do programa “Pontos nos J’s”. Figuras regionais e nacionais que mensalmente serão “postos à prova” num debate com os representantes, em Vila Real, das juventudes partidárias do PS (Rodrigo Sá), PSD (Armando Vieira) e CDS-PP (Joana Rapazote). Nesta estreia da colaboração com a Rádio Universidade, transcrevemos excertos do encontro radiofónico com Luís Filipe Menezes, autarca de Vila Nova de Gaia e candidato à liderança do PSD nas eleições do próximo dia 28. O programa, na íntegra, voltará à 104.3 FM já no próximo Domingo, pelas 11 horas.
Desenvolvimento Regional: Que mensagem pode levar para a Lisboa? Que projectos para o interior do País?
Esta é uma questão recorrente. Sempre que se discute sobre desenvolvimento do litoral “versus” desenvolvimento do interior fala-se numa lógica de solidariedade social, do aproveitamento cabal do território, da manutenção da identidade ligada a realidade do interior… Apesar de terem sido tomadas algumas medidas piedosas para combater esse fenómeno, a verdade é que Portugal deixou a economia do mercado a funcionar sozinha. As empresas e as pessoas foram para onde estavam os portos, os aeroportos, os equipamentos mais qualificados.
Agora, finalmente, existe uma nova janela de oportunidades que, se houver vontade e iniciativa política, pode contrapor a situação actual. Olhando para o mapa, chegamos à conclusão de que quem está mais perto dos 40 milhões de consumidores espanhóis é o interior norte do país. Se fossemos capazes de colocar uma parte substancial das nossas catedrais de consumo e serviços ao longo da corda fronteiriça, nós estaríamos muito mais próximos dos tais milhões de consumidores.
Potenciar não se trata de uma questão de solidariedade nacional e de equidade no desenvolvimento, um “cliché” muito piedoso mas pouco consequente e atractivo. Trata-se de seguir uma lógica de competitividade nacional.
Como se pode fazer? Através de políticas pró activas do Estado. Existe um conjunto de investimentos públicos previstos para os próximos anos, cuja sediação nesta área será um acto de inteligência. Um conjunto de verbas do Orçamento de Estado, complementadas por verbas da União Europeia que deveriam privilegiar projectos nesta zona do interior, por exemplo, ao nível da construção de parques empresariais de primeira linha.
Temos que pensar, também, na política económica do Estado, uma política que, para além de, do ponto vista nacional, ser errada, é desastrosa, para uma lógica deste género. Não há empresas a instalar-se deste lado da fronteira, quando, do outro lado, têm os consumidores a pagar muito menos IVA e as empresas a pagar muito menos IRC.
As SCUT’s…
Eu acho que falar, estritamente, das SCUT’s é redutor. A questão é se devemos ser ou não a favor do pagamento deferido de grandes investimentos públicos, feitos por antecipação, através de instrumentos de engenharias financeiras deste género. Sim. Sim, porque não acredito no discurso de que estamos a hipotecar as gerações futuras. A minha geração pagou as auto-estradas, pagou o saneamento, os eventos desportivos, a Expo-98… é bom que esta geração pague alguma coisa, num país onde está quase tudo feito. Temos é que garantir que esse dinheiro é devidamente utilizado. Se é para fazer SCUT’s com vista à compra de jogadores de futebol estrangeiros (apesar de ser um defensor da lusofonia, na Selecção), ou se fazem investimentos que tenham uma clara lógica de reprodutibilidade económica, como, por exemplo, a tal rede ferroviária, o desenvolvimento dos portos ou a aposta num sistema de Ensino Básico em quantidade e qualidade, num sistema de primeiro mundo. Porque não?
Como vê a proposta de deslocação dos armazéns do vinho do Porto do Município de Vila Nova de Gaia?
Tenho algumas reservas, não por razões bairristas ou regionalistas. A questão prende-se com o facto delas hoje serem mais uma sala de visitas, para o sector. Admito que uma mudança radical acarrete algum perigo, porque esta actividade tem uma carga histórica e cultural que formam uma identidade. É perigoso tocar em traços identitários de um povo, é como se fazer uma engenharia genética. Tenho algum receio, uma intuição sobre os reflexos negativos dessa matéria que tem que ser discutida.
E o processo de regionalização?
Parece-me que a regionalização é hoje uma questão pacífica, na sociedade portuguesa. Faz sentido que haja um patamar intermédio de gestão económica e política entre os Municípios e a Administração Central. No entanto, esta é uma matéria que tem que ser tratada com algum cuidado. O trauma do último referendo ainda está presente e julgo que se deve fazer uma discussão tranquila, procurando primeiro tirar do referendo os escolhos mais marcantes.
Acho que seria muito importante que, por exemplo, Miguel Cadilhe fosse um Alto Comissário Nacional para a regionalização, porque emprestava o seu prestígio de economista de referência ao processo.
Temos que pensar num desenho territorial que não cometa os erros do passado, mas temos que ter em conta que as cinco regiões têm quase 50 anos de vida, há toda uma lógica de organização do país, de hábitos dos autarcas, das populações, da administração. Fui a primeira pessoa, num congresso do PSD, em 1992, a avançar com a ideia de que uma das formas de acabar com a resistência de algumas populações e alguns agentes, no terreno, à regionalização, passaria pela escolha das capitais de cada região. Há 15 anos, defendi que, no caso do Norte, a capital fosse em Trás-os-Montes; a Região Centro deveria ter a capital em Viseu ou na Guarda; o Alentejo devia ter a capital na margem esquerda do Guadiana; a do Algarve devia ser na serra algarvia e a região de Lisboa e Vale do Tejo teria como capital Setúbal ou em Santarém.
Se este processo partir de um acordo entre os dois maiores partidos e se encontra uma autoridade que possa liderar o processo de discussão, instalação e desenvolvimento do projecto, creio que será pacífico.
Uma posição sobre o futuro do TGV
Eu sou daqueles políticos que mudam de opinião. Não sou como alguns que ainda vivem ligados a ancestrais referências do século XIX ou outros que não mudam de opinião, porque nunca tiveram opinião. Há um ano atrás, era contra o TGV, hoje já tenho uma abertura em relação a esse projecto. Temos necessidade de construir uma ferrovia de transporte de mercadoria, uma vez que a Linha do Norte já não comporta essa função. Construir uma nova linha, tem custos que serão de cerca de 70 a 75 por cento dos custos do TGV. Tendo em conta que a União Europeia o financia, em cerca de 20 por cento, ficará ela por ela… A solução será, então, construímos o TGV e libertamos a Linha do Norte só para o transporte de mercadorias. Penso que essa é uma boa solução e, quando eu for Presidente do PSD, vou entender-me com José Sócrates, sobre esta matéria.
Quais as prioridades como líder do PSD, caso seja eleito, no próximo dia 28?
O país tem que sentir que tem duas possibilidades de alternativa fortes, em termos de escolha, quando tiver que se pronunciar, em 2009. O trabalho fundamental que o PSD tem pela frente é fazer com que os eleitores e os cidadãos compreendam a nossa política de Saúde, Educação, Europa, Globalização, Segurança Social, Juventude… É preciso deixar claras as ideias, não através de elaboradíssimos programas eleitorais, mas, sim, através de meia dúzia de ideias força que reflictam uma orientação estratégica política.
Por exemplo: na Educação, a ideia é que a autoridade e o rigor de gestão voltem às escolas. Portanto, o PSD vai propor que os Directores de Escolas, os Directores de Agrupamentos, sejam os Reitores, à moda antiga, nomeados pela Administração, com contractos de gestão por três anos, com objectivos definidos, com responsabilidades clarificadas. Sabe-se quem é o rosto da escola, a quem se deve pedir responsabilidades. O PS que irá continuar amarrado à dita gestão democrática das escolas e o meu companheiro Marques Mendes defende uma ideia pior que estas duas, os concursos públicos, para escolher os Directores das Escolas. O importante é que as separações das águas sejam claras. Os cidadãos escolherão.
Não é deputado. Se for eleito líder do PSD, poderá ter alguma dificuldade, ao nível dos debates políticos que acontecem na Assembleia da República. Essa é uma desvantagem superável?
Exigem vantagens em estar no Parlamento, nomeadamente ser um interlocutor directo com o Primeiro- -Ministro, nos debates que, agora, vão ser quinzenais. Mas também há alguma desvantagem que decorre do facto de, infelizmente, o Parlamento não ser o mais prestigiado dos órgãos de debate e confronto político do país, não é o órgão de soberania a que os portugueses prestam mais atenção, uma situação que espero, para bem da democracia portuguesa, seja corrigido, nos próximos anos. É possível tentar minimizar os custos de não ter a possibilidade deste debate com o Primeiro-Ministro, recorrendo a outro tipo de oposição, uma oposição que esteja mais próxima das pessoas e dos problemas.
Maria Meireles