Presidente da UGT de Vila Real, Nataniel Araújo iniciou a sua carreira numa instituição bancária em 2008. Paralelamente, teve a oportunidade de trabalhar em órgãos de gestão com forte ligação à problemática de coesão social, em diferentes instituições, como vereador da Câmara de Vila Real e assessor do Parlamento Europeu.
Com formação na área da gestão pública e empresarial, tendo frequentado cursos na UTAD e na Porto Business School, para além de uma pós-graduação em direito do trabalho e segurança social, na Faculdade de Direito de Lisboa, o dirigente acredita que entidades como a UGT “são fundamentais” para a proteção dos trabalhadores, na pressão da concorrência em países com baixos salários ou a desregulamentação da legislação laboral.
Há quanto tempo está ligado à UGT?
Lidero a UGT de Vila Real desde 2018 e estou aqui com espírito de missão. Fui indicado pelo Sindicato dos Trabalhadores do Setor Financeiro de Portugal (SBN), que represento. A minha ligação à UGT existe desde o momento em que me torno associado do SBN, uma vez que este sindicato é filiado na UGT.
Como surgiu a oportunidade de liderar a UGT no distrito?
Em 2010, na instalação da UGT de Vila Real, fui desafiado para ser candidato a liderar a instituição, naquele que seria o congresso fundador e que instalaria a UGT no distrito. Na altura recusei, porque estava a iniciar o meu percurso profissional e não fazia sentido abraçar um projeto sem conhecer, de forma profunda, a realidade do setor e os desafios do mundo laboral.
Em 2018, no seguimento dos contributos e participações que fui iniciando no Sindicato dos Bancários do Norte, agora chamado Sindicato dos Trabalhadores do Setor Financeiro de Portugal, surgiu novamente o desafio para liderar a UGT de Vila Real. Nessa altura, senti que tinha já o conhecimento, a experiência e a disponibilidade de uma equipa de homens e mulheres, que até à data tudo têm feito para reforçar a imagem da UGT no distrito.
Quantos associados representa a UGT a nível distrital?
A UGT de Vila Real tem associados a si 23 sindicatos, que representam cerca de seis mil trabalhadores.
“Ao invés de se encarar os territórios do interior como um problema, há que os encarar como uma virtuosidade e que poucos ainda lhe dão valor”
Os sindicatos têm perdido força nos últimos tempos. Porque acha que isso está a acontecer?
Na história, a entrada do séc. XXI foi, e continua a ser, marcada por um ritmo de crescimento exponencial das grandes economias a nível global. Há, por isso, mais do que nunca, uma grande competitividade entre forças económicas e políticas a nível mundial que originam diversos desafios. O papel de entidades como a UGT é fundamental para a formulação de respostas a esses desafios na proteção dos trabalhadores, em particular na pressão da concorrência em países com baixos salários ou na desregulamentação da legislação laboral. O trabalho da UGT, junto dos trabalhadores e dos sindicatos, tem demonstrado uma evolução positiva no posicionamento destes atores sociais enquanto forças reivindicativas, para um futuro com mais e melhores condições de trabalho. A história e as conquistas laborais por parte dos trabalhadores são um testemunho da relevância da UGT. Sem esta Central Sindical, e sem os Sindicatos que a integram, os trabalhadores não teriam avançado, tanto no que respeita aos seus direitos, em que a economia e a ordem social estariam muito mais fragilizadas.
Há a ideia de que os transmontanos não são muito reivindicativos e participam pouco em manifestações. Porque é que isso acontece?
É importante ter em atenção que Trás-os-Montes é uma das regiões de Portugal com maiores taxas de despovoamento, com contraste por elevada afluência de população emigrante. Este contexto tem, naturalmente, desafios para a população da região, como o quebrar do distanciamento aos serviços públicos e privados. Uma das vertentes basilares do nosso trabalho com os sindicatos, foi sempre criar polos/gabinetes de proximidade para realização do nosso trabalho, o mais próximo possível das pessoas.
Sente que a UGT de Vila Real está mais próxima da comunidade?
Nós queremos acreditar que sim, e temos feito por isso. Desde logo, e muito cedo, iniciámos um processo de descentralização dos nossos serviços e abrimos uma delegação em Chaves, estabelecemos protocolos na Régua, Valpaços e Murça, por forma a ir ao encontro das necessidades das populações, não sendo, por isso, necessária a deslocação das pessoas até à sede da UGT, em Vila Real.
Abrimos também, em parceria com o IEFP, um Gabinete de Inserção Profissional em Valpaços para procurar minimizar as deslocações da população ao Centro de Emprego de Chaves. Medida que também contribui para a diminuição dos custos em deslocações das pessoas que procuram emprego ou formação, ou que tenham outras questões administrativas para tratar com o centro de emprego e para melhorar a proximidade nos contactos com as empresas que publicam as suas ofertas de emprego/necessidades de Recursos Humanos tão importantes para quem procura emprego/mudar de emprego. Estes GIP’s também foram uma prioridade para nós.
“É importante que quem cá mora também se possa sentir português de primeira”
Como vê o futuro dos territórios do interior, que perdem cada vez mais população?
Apesar de haver um forte movimento populacional do interior para o litoral do país, tem havido, nos últimos anos, um forte aumento dos esforços para captar e fixar as pessoas nas zonas mais despovoadas.
Uma das situações que a pandemia veio expor foi a melhoria de condições de trabalho que permitam o exercício de funções remotamente. Temos visto, por isso, o aumento do número de estrangeiros que escolhem Portugal como destino para trabalhar, usufruindo do melhor que o país tem para oferecer, alguns chamados “nómadas digitais”. Muitos dos destinos preferidos dfeste público são precisamente as regiões do interior, na procura de vivências mais tranquilas, afastadas do frenesim urbano. Acredito fortemente que esta mudança, como resultado da pandemia de Covid-19, terá um papel cada vez mais relevante na sociedade portuguesa, bem como no panorama mundial. Por isso, ao invés de se encarar os territórios do interior como um problema, há que os encarar como uma virtuosidade a que poucos ainda dão valor.
Não podemos é desistir de exigir, para nós, pelo menos o mesmo que outros territórios têm tido ao logo do tempo. Muitas vezes com a preponderância política dos nossos governantes, que no distrito de Vila Real tem sido uma miragem, que contrasta com o distrito de Bragança, onde há cinco secretários de Estado provenientes desse território. Julgo que também teremos pessoas competentes no nosso distrito para ocuparem estes lugares de destaque, e que poderiam também reivindicar uma melhoria significativa nas condições e vida de cada um de nós que cá vive.
Ainda vamos a tempo de inverter um ciclo de declínio económico e populacional, apostando inclusivamente nas sinergias com Espanha, aumentando assim as oportunidades que daí possam vir. É importante que quem cá mora também se possa sentir português de primeira.
A delegação da UGT pode ter um papel mais ativo e ajudar a melhorar as condições de vida no interior do país?
A UGT de Vila Real e outras instituições, através da sua capacidade reivindicativa, podem chamar a atenção para os desafios que os territórios do interior enfrentam, junto do Governo central. No que toca aos governos locais podemos, através da nossa presença constante, alertar para a necessidade de programas e projetos de longa duração e sem fins eleitoralistas, que impactem positivamente o emprego e as condições de quem cá trabalha.
A nossa região depende também da visão dos eleitos locais, cabe-nos convocar o mundo laboral para uma discussão pública que possa privilegiar a melhoria continua das condições de trabalho e a criação de oportunidades para todos, com a captação de investimento.
Quem a curto prazo opta por uma estratégia eleitoralista, contribui para a perda de população, para a perda de riqueza e para a falta de identidade. Quem, por sua vez, aposta numa visão de crescimento económico, na captação de investimento e na valorização dos trabalhadores, está a contribuir para a fixação das populações e a acautelar o futuro das novas gerações.
Uma das vossas missões é também qualificar as pessoas. Há muita procura pelos vossos cursos?
Os cursos de formação da UGT são administrados, essencialmente, em parceria com o Centro de Formação Sindical e Aperfeiçoamento Profissional (CEFOSAP). Estes cursos têm elevada procura por parte dos dirigentes sindicais e por parte dos trabalhadores ativos empregados/desempregados. A oferta formativa abrange, em larga medida, unidades de formação de curta duração, em diversas áreas, segundo referenciais do Catálogo Nacional de Qualificações.
Durante este mandato temos sido proativos na formação, iniciamos a formação on-line e concluímos com sucesso o primeiro curso de formação de formadores. Privilegiamos a formação em coaching, técnico auxiliar de ação educativa, restaurante e bar e auxiliar de ação médica.
Em abril do próximo ano termina o seu mandato. Que projetos gostaria de ver concretizados?
O nosso mandato termina com a realização do congresso da UGT Nacional em abril de 2022, que elegerá novos órgãos sociais, e que por sua vez obriga à realização de um congresso também em Vila Real, com o mesmo objetivo. Há projetos que fazem sentido continuar, outros darão a vez a novos projetos e vamo-nos ajustando a desafios/necessidades que possam vir a emergir.
No que respeita à componente de formação a ativos empregados e desempregados, é imperativa a adequação constante da oferta a novas necessidades do mercado de trabalho.
Temos de formar e reforçar as competências de especialistas por áreas que sejam relevantes para o distrito de Vila Real, sejam elas no setor do turismo, da agricultura, ou mesmo do setor agroindustrial.
A realização do 1º de Maio durante o nosso mandato pode ainda ser uma realidade, apesar de estar condicionado pelo evoluir da pandemia da Covid-19. Veremos se será possível a sua realização, uma vez que nos temos batido por este evento, considerando que será uma forma de chamar a atenção sobre os temas e desafios laborais do nosso território, bem como alertar para a necessidade das decisões políticas locais e nacionais serem sempre facilitadoras e não inibidoras da atração de cada vez mais tecido empresarial que fomente a fixação de população no nosso território, pois sem emprego não há pessoas.