Não se conformam as populações de Folhadela e Parada de Cunhos, com o traçado projectado da A4 no Estudo de Impacte Ambiental em fase de consulta pública. A nova via vai unir as duas freguesias, através de um viaduto de 2,7 quilómetros de extensão. Moradores apontam o alargamento do IP4 como solução ideal. Manifestações de descontentamento e de revolta têm surgido, nos últimos dias.
A Câmara Municipal de Vila Real defende um desvio, a sul de Parada de Cunhos. À medida que a discussão pública sobre o estudo se aproxima do fim, mais se acentuam as preocupações. As respectivas Juntas de Freguesia, através dos seus Presidentes, e a Comissão de Moradores, têm promovido debates e dado a conhecer algumas iniciativas na defesa dos interesses das populações. No Sábado, foi na Casa das Cardosas, em Folhadela. Anteontem, na Junta de Freguesia de Parada de Cunhos.
“Se defenderam os lobos, na A24, porque não são defendidas as pessoas, neste caso?”
No horizonte, várias formas de protesto vão tendo contornos, caso “o traçado previsto não seja alterado”, desde uma queixa, junto do Tribunal Europeu, até uma manifestação, em Vila Real, frente ao Governo Civil, assim como uma deslocação a Lisboa.
A alegada destruição de habitações e do património paisagístico vinhateiro e outras consequências ambientais são as razões do descontentamento. Ao todo, podem ir abaixo cerca de vinte casas. Se o valor dos imóveis poderá ser ressarcido, já o mesmo não se pode dizer da ligação sentimental às casas, por parte dos seus moradores. E, nestes, surgem dois casos. Um no lugar do Negrinho, em Vila Nova de Cima, e outro em Folhadela. Casas novas que devem ser demolidas e cujos donos estão “angustiados” com esta perspectiva.
Maria José e o marido, Queirós Gonçalves, têm uma imponente casa, no lugar do Negrinho, Vila Nova de Cima. Desde que souberam que a mesma poderia ser demolida, entraram numa enorme angústia e mostraram-se incrédulos, com a sua possível destruição. É que, no local onde está a casa, será construído um túnel. Uma obra de arte indesejada pelo casal que aponta as razões sentimentais e de saúde, como argumentos mais fortes, para o descontentamento que manifestam.
“Além do prejuízo, existe a parte sentimental incalculável e a doença do meu marido que sofreu uma transplantação, há um ano, precisa de uma vida sossegada e sem grandes bulícios”, acrescentou Maria José Queiroz que acrescentou: “Agora, estamos a ficar completamente desorientados”.
O seu marido contou, ao Nosso Jornal, aquilo que lhe ia na alma: “Trabalhei 37 anos, estou reformado e, desde que tive conhecimento deste projecto, não tenho conseguido dormir mais de 3 a 4 horas por noite”. O desespero de Maria José leva a admitir uma comparação: “Julgo que haverá alternativas. Se protegem as alcateias de lobos, na A24, como é que não defendem o interesse das populações?”.
“Obra terá efeito maléfico ambiental e a Rede Natura 2000 será afectada”
A revolta dos moradores das duas freguesias levou-os a constituir uma Comissão, agregando, à sua volta, autarcas e alguns docentes da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, UTAD. Jorge Rocha, cuja casa, nova em folha, está na “rota de colisão” da A4, abordou, ainda, a construção de um viaduto, sobre o Vale do Corgo e que vai unir o nó de Parada de Cunhos até Folhadela.
“É um pontão de 2700 metros, uma barreira enorme de betão que vai afectar esta paisagem. Foi um estudo feito nos gabinetes, em Lisboa e não no terreno. Vamos continuar a pressionar as autoridades, para que continuem a fazer novos estudos e credíveis”.
Um dos elementos que fazem parte do grupo de docentes da UTAD que estão a analisar o estudo de impacte ambiental é Rui Cortes. Este considera mesmo que “a obra terá um efeito maléfico ambiental e a própria Rede Natura 2000 será afectada”, sublinhando que vai cortar o Vale do Corgo, em termos paisagísticos. Na sua óptica, “está em causa todo um equilíbrio da flora e da fauna, com o volume de aterros e escavações muito elevados”. Rui Cortes acrescentou: “Devo dizer que, em relação à alternativa um, impõe dez vezes mais mobilizações de terra”.
Populações podem
apresentar queixa,
no Tribunal Europeu
Por sua vez, Ana Rocha, elemento da Comissão de Moradores de Folhadela, adiantou, ao Nosso Jornal, algumas acções em curso e outras a tomar.
“Estamos a elaborar um abaixo-assinado que contém mais de mil e duzentas assinaturas”, ao mesmo tempo que técnicos da UTAD preparam um relatório técnico, rebatendo a solução aprovada de construção deste troço da A4”. Os documentos serão enviados, conjuntamente, até 2 de Agosto, à Agência Portuguesa do Ambiente.
No horizonte, está, igualmente, a apresentação de uma queixa, junto do Tribunal Europeu, “caso as pretensões não sejam atendidas. Nas duas freguesias, além da demolição das casas, noventa por cento das habitações de Folhadela ficarão a cerca de cem metros do formidável viaduto, o que acontecerá, também, em Parada de Cunhos. A própria Câmara Municipal de Vila Real decidiu pedir uma audiência à Estradas de Portugal e recomendar que o troço da Auto-Estrada A4, entre Parada de Cunhos e a Auto-Estrada A24 (Solução 1), seja desviado, para sul, em Parada de Cunhos e Folhadela; e, para norte, na zona do Loteamento Industrial de Constantim.
Refira-se que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do projecto “IP4 – Vila Real (Parada de Cunhos) e Bragança (Quintanilha), vai aproveitar cerca de 80 por cento do corredor do actual IP4, para a construção da Auto-Estrada
O resumo não técnico do EIA pode ser consultado, até 2 de Agosto, na sua sede, em Lisboa, e na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (Porto), bem como nas Juntas de Freguesia e Câmaras Municipais dos concelhos atravessados pelo IP4, designadamente Vila Real, Sabrosa, Alijó, Murça, Mirandela, Macedo de Cavaleiros e Bragança.
José Manuel Cardoso