Domingo, 1 de Dezembro de 2024
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Violência Doméstica aumenta em Trás-os-Montes

A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, APAV, deu a conhecer os números preocupantes de maus-tratos e violência doméstica referentes a 2008. A região de Trás-os-Montes, abrangida pela delegação da APAV de Vila Real, teve 373 casos sinalizados no último ano, o que representa mais 3,7 por cento do que em 2007. Números que projectam os distritos de Vila Real e Bragança para o 13.º lugar entre os 22 a nível nacional. Em 2009, os números continuam a ser preocupantes. Só desde Janeiro até meados de Fevereiro, a delegação de Vila Real já registou mais sessenta casos de violência doméstica.

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Hoje assinala-se o Dia Europeu da Vítima do Crime, a APAV irá assinalar a efeméride com a realização, em Lisboa, do Semi-nário/Debate “Prevenção Integrada da Violência: as 4 dimensões – relacionamentos, sexualidade, igualdade de género e depen-dências”. A responsável pela Dele-gação da APAV de Vila Real, Elisa Brites, abordou, ao Nosso Jornal, os dados de 2008 e a intervenção do organismo para mediar e ajudar a resolver muitos destes dramas sociais. “Os números de 2008 subiram ligeiramente. É natural que nos próximos anos eles continuem a subir. Ainda há muitas situações de vitimação e a procura continua a ser muita. Posso adiantar que, até ao momento, o Gabinete de Apoio à Vítima já vai com cerca de 60 novos casos, desde o início do ano, e tem aumentado o número de pessoas que procuram a APAV enquanto vítimas de crimes”.

No que respeita à Região de Trás-os-Montes, as situações de vitimação doméstica atingem “cerca de 95 por cento do total das situações registadas, na maioria são mulheres e os agressores são homens. Os distritos de Vila Real e Bragança receberam mais queixas de agressões físicas e psicológicas. As formas que o agressor utiliza para controlar a companheira ou companheiro são a intimidação e a coacção”. Contudo, emerge uma nova forma de violência. “Estão a aparecer com mais frequência sinalizações de actos de agressão contra idosos. Uma parte deles integrados no contexto familiar em que os agressores são familiares próximos, filhos e pessoas que convivem com eles. Efectiva-se através do controle económico por um lado, e também, muitas vezes, com actos de negligência, em que não são dados os cuidados mínimos, seja a nível da alimen-tação ou da higiene”, referiu Elisa Brites.

Segundo esta responsável, a violência doméstica não escolhe idades. “Muitas vezes, notamos estes comportamentos desviantes numa fase muito precoce, ao nível da adolescência, nas escolas e nas relações de namoro culminando, muitas vezes, em união de facto ou casamento. Tem a ver com diversos factores, como a forma de estar e de ser, a educação, o ambiente cultural onde o indivíduo está inserido. Infelizmente, continuamos a ter este tipo de conduta e nós tentamos ajudar a resolver estas situações. As pessoas podem pedir ajuda aqui no Gabinete de Vila Real, situado nas instalações do Governo Civil”.

Em relação à data que hoje se comemora, Elisa Brites deixou uma mensagem. “É importante assinalar esta data com o intuito de lembrar que há pessoas que são vítimas de todo o tipo de crimes. Nunca é de mais lembrar. A população tem que estar alertada para a violência que existe nas mais diversas formas de crime, e que há maneira de resolver através do apoio que prestamos. Em conjunto poderemos ultrapas-sar essa problemática”.

Em 2008, nos distritos de Vila Real e Bragança foram registados 250 casos de Violência Doméstica, sendo que 90 por cento dos agressores são do sexo masculino.

A nível nacional, os números não diferem com 90 por cento dos autores dos crimes são também homens e situam-se numa faixa etária dos 26 aos 55 anos de idade (43,2%).

Relativamente aos dados de identificação da vítima, a tendência mantém-se inalterável uma vez que continuam a ser, maioritariamente, as utentes do sexo feminino (87,1%) as vítimas mais visadas. A faixa etária mais atingida, tal como em anos anteriores, mantém-se entre os 26 e os 45 anos de idade. Sendo que as características familiares das vítimas de crime encontram- -se grandemente associadas à chamada família tradicional, onde 47,6 por cento das vítimas são casadas e 52,6 por cento pertencem a uma família nuclear com filhos.

Os crimes de maior relevo encontram-se distribuídos por seis categorias: a violência doméstica, os crimes contra as pessoas e humanidade, os crimes contra o património, a vida em sociedade e o Estado, os crimes rodoviários e outros crimes. De entre estas seis categorias, a violência doméstica é, sem dúvida, a que mais se destaca. No global, esta categoria representa 90 por cento dos 18 669 crimes assinalados.

Os crimes com maior relevo são os maus-tratos físicos (27,1%) e psíquicos (30,9%). De entre os 6980 casos de violência doméstica, cerca de 90 por cento dos mesmos foram praticados contra mulheres, situando-se estas fundamen-talmente nas faixas etárias entre os 26 e os 45 anos de idade (34,6%).

Refira-se ainda que a PSP foi a entidade mais solicitada para o efeito, seguindo-se a GNR.

 

 

“Ainda se continua a chorar baixinho…”

Uma mulher, residente numa freguesia do concelho de Mondim de Basto, traçou ao Nosso Jornal a angústia de uma vida de maus tratos e violência.

“Tenho 40 anos e vivi com o medo em casa de meus pais, metade da minha vida. É quase sempre um medo silencioso, não se fala muito disso, chora–se baixinho e no dia seguinte sai-se para a rua como se nada tivesse acontecido.

Lembro-me de gritar e saltar os muros a pedir ajuda aos vizinhos que, sabendo do que se tratava, ficavam em silêncio e não abriam a porta. Lembro–me do meu pai nos fechar num quarto, a mim e à minha irmã, para poder bater à vontade. A minha cabeça rolou pelo passeio e paredes. Lembro-me de sermos ameaçadas com um revólver e as autoridades dizerem que nada podiam fazer. O que ainda não passou mesmo, e duvido que alguma vez passe, são os barulhos e gritos que ficam na nossa cabeça.

Hoje tudo é diferente, ou deveria ser. Hoje, sabemos que devemos gritar alto e que há portas que se abrem quando pedimos socorro. Hoje, as autoridades e instituições já nos defendem. Mas, ainda hoje, há mulheres espancadas e mortas. Ainda há filhos, como um dia eu fui, que choram e têm medo de ir para casa no final da escola.

Apesar de tudo ainda se continua a chorar baixinho…”

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