Ao iniciar esta celebração saúdo os peregrinos e turistas que vieram de vários concelhos da diocese de Vila Real, da arquidiocese de Braga (além do rio Tâmega), da diocese do Porto (desde Amarante a Afurada).
Saúdo o senhor Arcipreste e os Párocos presentes, o senhor Presidente da Câmara e outras Autoridades do concelho, os Escuteiros e os Bombeiros.
Com o mistério da Ressurreição que celebramos em todos os Domingos, queremos honrar Nossa Senhora neste Domingo próximo do dia oito, o dia do seu aniversário natalício e lançar do alto um olhar sobre a nossa vida.
1- As festas deste Domingo e do próximo têm a sua raiz na festa do dia oito, dia da Natividade de Maria. Se contarmos nove meses a partir do dia oito de Dezembro, dia em que Maria começou a existir como Imaculada no coração de Santa Ana, sua mãe, teremos exactamente o dia oito de Setembro como a festa do Nascimento de Maria, ou Natividade de Maria. É o dia do seu Natal. Por ser habitualmente dia de trabalho, o povo cristão celebra essa festa no Domingo anterior ou no seguinte àquele dia, e dá-lhe vários nomes: Senhora da Ajuda, Senhora da Saúde, Senhora dos Remédios, Senhora da Pena, Senhora de Almodena, e outros títulos. Aqui chamamos-lhe Senhora da Graça.
Por que razão celebramos o nascimento de Maria? Que valor tem para nós? – O nascimento de Maria é o início da salvação do mundo. O missal chama-lhe a aurora que anuncia o sol, a manhã que anuncia o dia. Deus não quis vir ao mundo como os anjos, mas como um homem verdadeiro e para isso preparou a mulher que seria a Mãe de Jesus. Quando dizemos «Senhora da Graça» queremos dizer Senhora da Incarnação, a graça é o seu Filho, Jesus Cristo, o Menino que ela traz ao regaço, a maior graça que Deus concede ao mundo.
As palavras que ouvimos nas três leituras de hoje parecem escritas para falar de Nossa Senhora: a humildade – «quanto maior fores mais deves humilhar-te»; a comunhão dos santos – «aproximastes-vos do monte de Sião, de uma assembleia de primogénitos que têm os nomes inscritos no Céu»; o amor ao próximo – «serás feliz quando as pessoas não tiverem com que retribuir o bem que lhes fizeste».
A humildade não é tacanhez, é viver a nossa vocação e aceitar o lugar dos outros no teatro da vida; a comunhão dos santos é viver a alegria da fé com os outros cristãos neste mundo e no outro, é não se isolar da vida da paróquia, da catequese, do grupo coral; ajudar os outros é andar atento aos que nos rodeiam no trabalho, na vida profissional, até no governo das comunidades. Em tudo isto a Senhora é modelo; basta recordar as bodas de Caná em que ela, sem pedido de ninguém, intervém em favor dos noivos numa hora de aflição.
Senhora da Graça e Senhora de Fátima
2- Neste ano de 2007 faz 90 anos que a Senhora cheia de graça veio a Fátima para ajudar o mundo. Aproximemos este Monte Farinha, em Mondim de Basto, da serra de Aire, em Fátima. Aqui fomos nós que construímos o santuário para nos encontrarmos com a Senhora, lá foi a Senhora que desceu ao monte para se encontrar connosco; aqui somos nós que subimos, lá é Ela que desceu. Nos dois casos é a mesma Senhora, é o mesmo coração de Mãe. Por isso foi boa ideia colocar no santuário as duas imagens da única Senhora, com os títulos de Senhora da Graça e Senhora de Fátima.
Nestes 90 anos foram imensos os benefícios trazidos ao mundo, sendo o mais espectacular de todos a destruição do muro de Berlim, símbolo da queda do império do comunismo, e a sua queda deu-se sem guerra, sem um tiro, sem uma morte. Tudo caiu como um baralho de cartas. Outra graça visível foi a protecção concedida ao Papa João Paulo II na praça de S. Pedro, como ele próprio reconheceu.
Nesta data, já morreram os três pastorinhos, mas a mensagem da Senhora não morreu, continua actualíssima. São três os pedidos que Ela fez em Fátima e que recordo aqui: rezar mais, fazer penitência, mudar de vida. Esses três pedidos são como as pessoas da Santíssima Trindade, inseparáveis entre si, cada um deles requer os outros dois.
Rezar mais. Rezar é falar com Deus e ouvir a sua voz interior. Sentimos que o barulho do mundo e os horários de trabalho tornam mais difícil encontrar tempo para rezar em família e individualmente. Parece que a casa de família está sempre ocupada com visitas e nunca há disposição para rezar em casa e para a Missa de Domingo. É indispensável ter coragem, disciplinar o tempo, dar importância ao que é importante, saber fechar a televisão algum tempo, e ir para a cama nas noites de sábado para nos podermos levantarmos nas manhãs de Domingo. Sem essa coragem, sem essa disciplina, dificilmente poremos ordem em casa e na vida, tornando-nos escravos do mundo.
Mesmo nos santuários fazemos bem em conservar o silêncio, o recolhimento e a paz, afastando daqui todo o barulho do mundo. O mundo não quer se fale de Deus, nem das consciências, e por isso procura transportar para eles toda a algazarra mundana. Muitos santuários antigos acabaram porque o mundo tomou conta deles e Deus afastou-se.
Fazer penitência. Fazer penitência é não fazer a vontade ao corpo nem ao mundo. A penitência que a Senhora quer, dizia a Lúcia, é aquela que anda ligada ao trabalho de cada dia. A Senhora nunca pediu caminhadas a pé até Fátima nem dias inteiros a pão e água. Isso pode fazer-se com as devidas cautelas, mas mais importante e até mais custoso é caminhar todos os dias do ano de casa para o trabalho e do trabalho para casa, e todos os Domingos para a Missa na igreja, gerar um filho, ampará-lo nas idas à catequese e à escola, ajudá-lo a ser cristão e a saber trabalhar. Aos estudantes lembro a penitência da inteligência, estudar a sério. Reina no mundo uma certa confusão de ideias, uma ignorância das coisas de Deus, e, como diz a Bíblia é preciso «amar a Deus com toda a inteligência». Infelizmente, nesta questão de ideias e princípios morais não podemos contar com a ajuda dos Estados, laicos e unicamente interessados pela economia.
Mudança de vida. A mudança de vida é a maior penitência. Quando temos uma doença grave somos capazes de todos os sacrifícios, até de fazer um transplante do fígado ou dos rins e até do coração quando isso é possível. A mudança de vida é essa alteração de comportamentos errados, de vícios e de aventuras. Aqui, porém, na vida pessoa, não há transplante possível. Cada um é que tem de ir mudando a sua vida. E não há mudança de vida sem rezar nem fazer penitência. Toda a doença para ser curada requer do doente exercícios de dieta e cuidados de convalescença durante semanas e anos.
Conclusão:
Do alto deste monte, elevados acima dos lugares de trabalho, avaliamos melhor a nossa vida: o presente e o futuro, a vida de cada um, a vida de família, a vida da Diocese, a vida de catequese paroquial, a vida das escolas que brevemente recomeçam. Tudo se torna mais claro. Peçamos à Senhora luz e coragem.
Com os olhos postos em Jesus que por nós morreu e ressuscitou, vamos continuar a festa dos anos de Nossa Senhora. Que ela interceda por nós de modo que a nossa vida tenha graça, seja agradável a Deus, e se transforme numa vida feliz, uma vida engraçada.
* Bispo de Vila Real