A descrição do PRR motiva esperança e toca em algumas das principais necessidades de Portugal, nomeadamente “reformas”, “crescimento económico” e “convergência com a Europa”. O futuro dirá se estes objetivos tão desejados são cumpridos, mas uma análise rápida revela, desde logo, que a bazuca dificilmente será uma oportunidade para promover descentralização e maior dinamização das regiões do interior. Aliás, o PRR parece fomentar ainda mais a centralização em torno da Área Metropolitana de Lisboa.
O Governo autorizou a contratação excecional de 1.295 funcionários para a gestão do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR). Destes, 1.062 (82%) vão ser integrados em estruturas centralizadas com sede em Lisboa. Apenas 233 dos novos empregos serão destinados a funções fora da capital. Os ministérios do Trabalho, da Justiça, da Saúde e do Ambiente são alguns dos que concentram mais empregos para execução dos projetos da bazuca europeia.
O Congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) aprovou uma resolução (aprovada pelos presidentes de câmara, sem votos contra) onde refere que “o PRR reflete uma visão centralista e centralizadora, tendo arredado os municípios da sua gestão e das prioridades de intervenção”.
A ANMP destaca ainda a “falta de transparência” do processo, uma vez que “parte dos fundos está comprometida sem que tivessem sido previamente conhecidos os contornos dos projetos e das entidades a apoiar”, pelo que “não promove, como deveria, a coesão territorial”.
Lisboa representa cerca de 5% da população nacional, tem 14% da população trabalhadora mas vai receber mais de 80% dos novos funcionários contratados para gerir o PRR. A bazuca poderá ter a ambição de “reformar”, mas falha logo no essencial: fomentar a descentralização como meio para potenciar o desenvolvimento do todo. Um sinal dissonante num país cada vez mais circunscrito à capital.