Os dados do Bando de Portugal permitem constatar que houve uma diminuição da desigualdade salarial no setor privado em Portugal ao longo dos últimos anos, entre 2006 e 2020. No entanto, essa evolução não aconteceu apenas pelos melhores motivos. A redução da desigualdade salarial deve-se à forte quebra dos salários (ajustados para a inflação), da população com o ensino secundário e, sobretudo, com o ensino superior, e, por outro lado, à subida do salário real da população com ensino básico ou inferior, impulsionada pela subida do salário mínimo nacional. A conclusão é do estudo “A distribuição dos salários em Portugal no período 2006-2020”, publicado pelo Banco de Portugal.
Em termos reais, a preços de 2020, a remuneração média dos trabalhadores menos qualificados aumentou 14% em termos acumulados neste período, passando de 934€ mensais em 2006, para 1.064€ em 2020. Mas, no caso dos trabalhadores com ensino secundário, regista-se uma queda de 4% (de 1.273€ para 1.221€), com o tombo a atingir os 8% no caso dos trabalhadores com ensino superior (de 2.035€ para 1.878€). Com os salários mais baixos a crescerem mais do que as remunerações mais elevadas – que, em alguns casos, até caíram em termos nominais – a desigualdade salarial no país diminuiu neste período, destaca o Banco de Portugal.
Estes números tornam claro que a análise cega da evolução de indicadores simples de desigualdade (como o Coeficiente de Gini), pode facilmente induzir-nos a conclusões erráticas. De facto, entre 2006 e 2020 a desigualdade salarial em Portugal reduziu, mas isso esconde a queda significativa dos salários reais dos mais qualificados (que, aliás, encontram na emigração a solução para evitar esta queda). Num país com um crescimento económico anémico nas últimas décadas, a redução da desigualdade só pode ser feita à custa da perda de poder de compra de uma parte alargada da população. Podemos olhar para o copo meio cheio (o aumento de salários dos menos qualificados), mas sem um sustentado crescimento económico teremos sempre também a visão do copo meio vazio, com inúmeras consequências nefastas para as famílias e para a sua qualidade de vida.