No dia 7 de Julho o Papa publicou um documento em que autoriza a celebração da Missa segundo o Missal de 1962 aprovado pelo Papa João XXIII e anterior ao Concílio. Traça uma série de orientações canónicas para os bispos diocesanos disciplinarem esta concessão.
De modo imediato, trata-se de uma tentativa de reconciliar um grupo de cristãos, mormente franceses que nunca aceitaram a Liturgia do Concílio, chefiados por Mons. Lefêbre que ordenou alguns bispos e cuja ordenação, não sendo legítima, foi válida e são por isso verdadeiros bispos ainda que cismáticos. Todavia, a concessão do Papa vai para além do simples remédio de uma crise local, e institui uma variedade de ritos celebrativos.
Convém recordar que este gesto do Papa não é uma inovação histórica nem doutrinária. A Igreja teve sempre um modo oficial, um rito, de celebrar a fé. Mas ao lado desse modo geral e oficial, houve sempre em algumas dioceses antigas (Milão, Toledo, Braga durante algum tempo, e Ordens Religiosas) outros ritos algo diferentes. O Concílio Vaticano II estabeleceu um rito de celebração algo diferente do que vinha de Trento e já modificado pelo Papa João XXIII, com textos novos, o qual, mantendo a fé da Igreja de sempre, se tornou comum em todo o mundo, pela sua novidade e também pela muita mobilidade humana do nosso tempo que aconselha um rito de união geral.
Todavia, pelas razões de reconciliação acima apontadas e porque em alguns lugares se invoca a riqueza cultural e artística do latim e de outros ritos, Bento XVI tomou esta decisão pastoral, aceitando, ao lado do rito oficial nascido do Concílio Vaticano II, o rito imediatamente anterior ao Concílio e alguns outros ritos que nunca desapareceram. Pastoralmente, mais que a restauração do latim, o que este gesto deve lembrar a todos os católicos (padres e leigos) é a necessidade de não banalizar a celebração da fé, seja ele qual for o rito usado, respeitar a duração, os gestos, as palavras, os silêncios, os cânticos, as leituras da Missa. O facto de o rito conciliar ser em vernáculo, de o padre estar fisicamente voltado para a assembleia (religiosamente esteve sempre «voltado para Deus» a quem dirige a oração diante do povo), e os cânticos serem também na língua local, constituiu e constitui um convite permanente à facilidade que redundou na banalização. Essa banalização do rito da celebração, aligeirada para ser falsamente alegre e sem respeito pelo mistério celebrado, está na base da saudade psicológica de alguns cristãos por algo que pareça mais contido e misterioso. E esse vício da banalização pode acontecer sempre, qualquer que seja o rito usado. Só se extingue pela conversão.
JG