Importa por isso conhecer melhor a nossa floresta, em particular um indicador que faz enorme diferença: haver ou não gestão dos nossos solos.
Estima-se que apenas pouco mais de 850 mil hectares (26,7% dos 3,31 milhões de hectares de floresta contabilizados em 2020) da floresta portuguesa tivesse um plano de gestão de longo prazo em 2020, com objetivos de conservação e/ou produção. As florestas são geridas sob um plano a longo prazo (10 ou mais anos) para atingir objetivos sustentáveis, com revisões periódicas. Os planos de gestão florestal incluem planos de proteção florestal para áreas protegidas e a área florestal é cuidada por gestores florestais/ambientais profissionais.
Entre os países da UE analisados, ou seja, com dados disponíveis, Portugal é o segundo país com menor percentagem de área florestal com plano de gestão de longo prazo (apenas superando a Itália). O número nacional fica muito aquém da realidade europeia, cuja média supera os 70%. Vários países gerem ativamente 100% da sua floresta, como é o caso da Eslovénia, Hungria, Finlândia ou República Checa. É também interessante o facto de entre os países com menor percentagem de área florestal com plano de gestão estarem entre os países onde a área ardida por cada hectare de área terrestre é superior.
Em Portugal, 97% da floresta pertence a proprietários privados. No entanto, não parece existir uma relação direta entre o tipo de propriedade – floresta pública ou privada – e o facto de esta ser gerida ou não, de acordo com os dados compilados na Base de dados da UNECE – Comissão Económica das Nações Unidas para a Europa.
Os inúmeros estudos publicados, inclusive os relatórios das Comissões Técnicas Independentes (CTI) realizados aos grandes fogos de 2017, destacam que o fator crucial para a propagação dos fogos é se há acumulação de matos ou não, ou seja, se há gestão. Aliás, uma das CTI de 2017 concluiu que “as áreas de eucaliptal puro com mato arderam numa percentagem de 14,6% em comparação com as áreas sem matos em que essa percentagem foi apenas de 6,0%”. Quanto ao pinheiro, “arderam 11,1% das áreas de povoamentos puros sem matos contra 19,6% de povoamentos puros com matos”. De realçar ainda que desde 2001 os matos e pastagens representam 44% da área ardida, contra 20% de áreas com pinheiro-bravo e 18% com eucalipto.
O abandono dos meios rurais e de muitas atividades agrícolas, acompanhado por uma economia frágil, empresas descapitalizadas e baixos salários, conduz infelizmente ao cenário que assistimos: pouca riqueza gerada com os solos e por isso não geram incentivos e rendimentos suficientes para a sua preservação e proteção, criando assim um contexto privilegiado para o surgimento de grandes fogos.