Domingo, 8 de Dezembro de 2024
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2023: Um ano de incertezas e de cinto apertado

Tendo em conta a taxa atual de inflação, são muitos os que anteveem um ano de 2023 negro, em termos económicos e sociais.

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Mário Centeno, governador do Banco de Portugal, disse, há dias, que “o cenário prolongado de inflação trará incerteza, perda de confiança dos agentes económicos e uma inevitável recessão”.

Como se sabe, a taxa de inflação atingiu, em outubro, números históricos, com Portugal a registar uma taxa de 10,6% (segundo dados do Índice Harmonizado de Preços no Consumidor). As taxas anuais mais baixas registaram-se em França (7,1%), Espanha (7,3%) e Malta (7,4%). Já no extremo oposto, com as maiores variações, ficaram a Estónia (22,5%), Lituânia (22,1%) e Hungria (21,9%).

De acordo com o mesmo indicador, na Zona Euro, o maior contributo para a taxa de inflação veio da “energia (+4,44%), seguindo-se a alimentação, álcool e tabaco (+2,74%), serviços (+1,82%) e bens industriais não energéticos (+1,62%)”.

PREVISÕES

A recuperação pós-pandemia e a guerra na Ucrânia, a que se juntam outros fatores, deram origem à espiral inflacionária que se tem registado nos países ocidentais, entre os quais Portugal.

Para perceber melhor como será o próximo ano, fomos até à Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) falar com Patrícia Martins, professora do departamento de Economia, Sociologia e Gestão. Diz-se uma pessimista por natureza, mas quer acreditar que 2023 não será um ano tão mau quanto se espera.

“Eu olho para as previsões do Orçamento do Estado e penso: Deus queira que seja só isto e que estas previsões estejam corretas. Vamos ter um crescimento económico muito mais baixo que o deste ano, mas ainda assim espera-se um aumento do emprego. A minha dúvida é sobre as consequências que teremos no mercado de trabalho, porque se as empresas perceberem que estão a ter menos procura, vão acabar por ter de despedir pessoas”, afirma.

E se isso acontecer, “vamos ter um problema em cima de outro problema, ou seja, inflação e desemprego ao mesmo tempo, um fenómeno que já tivemos na década de 70, a que chamamos estagflação, e é aquilo que não queremos, um aumento simultâneo dos preços e do desemprego porque a economia não lida bem com esse tipo de situações”, refere.

Para 2023, “o Banco Central Europeu (BCE) vai continuar a aumentar as taxas de juro e isso é uma certeza, porque está comprometido com uma taxa de inflação de 2%, sendo que as previsões variam entre os 5 e os 7%. Quer isto dizer que o BCE tem de reduzir a taxa de inflação e só o consegue fazer aumentando as taxas de juro, não tem outra alternativa”.

A professora universitária recua cerca de 30 anos para lembrar o período em que tivemos, também, “uma taxa de inflação de dois dígitos”. Contudo, “nessa altura havia taxas de poupança de 20%. Agora, são muito mais baixas e perante um aumento dos preços não temos uma almofada financeira que nos permita manter o nível de consumo”.

“À medida que os preços vão aumentando, e tendo em conta que estão a aumentar em dois setores muito importantes, como a energia e a alimentação, as famílias vão ficando com menos poder de compra”, adianta, reforçando que “o BCE vai aumentar as taxas de juro, os custos de produção vão-se traduzir num aumento dos preços e esses aumentos vão ser maiores nos setores onde há menos concorrência”.

OTIMISMO

Quisemos saber, também, a opinião de Fernando Peixinho, professor do Instituto Politécnico de Bragança (IPB) relativamente a 2023. Segundo o docente, “as previsões mais otimistas apontam para um crescimento da economia portuguesa que rondará 1,3% (previsão inscrita no Orçamento de Estado), o que, tendo em conta o efeito da inflação, podemos estar na presença de um crescimento nominal que não corresponde a um crescimento real”

Em algumas das potências mundiais, “para 2023, prevê-se que a Alemanha, a França e a Inglaterra possam entrar em recessão, o que, dado o peso que têm na economia europeia, é, sem dúvida, um sinal muito preocupante”. E há ainda a China, “cujo crescimento do PIB andava sempre próximo dos 10% e que terá, este ano, um crescimento em torno dos 2,8%. Em 2023, o crescimento será de pouco mais de 1%”.

“Estamos perante um cenário sem precedentes nos últimos 30 anos, que, seguramente, vai trazer consequências agravadas para a vida dos cidadãos e das empresas”, admite.
Portugal tem “alguns fatores que podem contribuir para um efeito menos agudo da crise que se avizinha. Somos o país da Europa mais distante do epicentro do conflito entre a Ucrânia e a Rússia, o que nos confere uma imagem de mais segurança que, certamente, vai influenciar as preferências dos turistas pelo nosso país. Temos, apesar de tudo, conseguido conter o crescimento da dívida pública, o que, para as agências de rating, pode aliviar a situação em que nos encontramos e, com isso, beneficiar de condições de financiamento mais atrativas. E temos à disposição cerca de 65 mil milhões de euros para, até 2025, podermos usar para apoiar programas de investimento que impulsionem a economia e as empresas”.

“Digamos que, não se estando perante um quadro macroeconómico favorável, associado a um enquadramento externo recessivo, dispomos de alguns instrumentos que nos permitem perspetivar o futuro de uma forma menos sombria, sendo, no entanto, indispensável que a gestão dos fundos comunitários e a gestão da política orçamental convirjam para que se cumpram, com eficiência, os objetivos de estabilização económica e financeira”, acrescenta.

Patrícia Martins, da UTAD, admite que “tem de haver um equilíbrio”. “Por um lado, precisamos de resolver o problema da inflação, o mais rapidamente possível, sem que haja um grande impacto social e aí é que precisamos do Governo, para que possa auxiliar as famílias com mais dificuldades”.

Espera-se um ano de incertezas, de muitos desafios, tanto para as empresas como para as famílias. No caso das empresas, Patrícia Martins não tem dúvidas de que, as que terão mais dificuldades serão “as que trabalham com os mercados externos, porque têm de se sujeitar aos preços praticados lá fora”.

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