Domingo, 26 de Janeiro de 2025
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Voltar a brincar na rua

Como muitos da minha idade, tive a sorte de crescer e brincar na rua e no campo.

Ainda me lembro perfeitamente das muitas atividades que fazíamos em conjunto: jogar à bola num descampado quatro ou cinco dias por semana ao fim do dia; ir e vir para a catequese em conjunto, a pé, onde as conversas eram sempre agradáveis; organizar torneios de cross com as bicicletas, que nos custavam as tatuagens daquele tempo, arranhões por todo o lado; irmos para o rio tomar banho nas tardes tórridas e solarengas; irmos à pesca e apanharmos trutas vistosas ou um quilo de peixes para uma petiscada; os trabalhos no campo na lide do feno, do centeio, da batata e do milho, que apesar de custosos, eram agradáveis porque eram feitos em família e com amigos; e até os périplos que fazíamos em conjunto à mão desarmada pelas frutas da época, que às vezes nos valiam a perseguição inglória dos donos; os bons momentos que se passavam junto dos padrinhos e dos avós; os passeios no monte. Entre tantas outras coisas.

Hoje percorro as ruas das vilas e aldeias e não vejo as crianças a brincar em lado nenhum, a não ser em atividades organizadas pontualmente pela escola ou outra instituição. Não vejo os jovens a organizar nada por eles próprios, no espaço público, e a estar na rua de forma saudável. E vejo os pais, nem todos, todos os dias a guerrearem com os filhos que vivem, praticamente, absorvidos pelos telemóveis e os tablets, não sabendo fazer outra coisa e não querendo outra coisa. Já são muitos os estudiosos a dizer que é preciso fazer mudanças urgentemente, sair de uma infância e adolescência baseadas no telemóvel e nas viscosas redes sociais e regressar ao tempo em que se brincava na rua. Falta mundo real e rua às crianças e jovens de hoje.

Talvez as novas gerações sejam mais vítimas do que protagonistas. As próprias empresas tecnológicas reconhecem que fazem os seus produtos com grande poder de atração e para viciar, a família vive no sufoco da dispersão e da falta de tempo, o hedonismo é rei e senhor na inspiração dos comportamentos, há toda uma superproteção que está montada, não admitindo nenhum descontrolo. Daqui decorrem alguns dados inquestionáveis: há mais problemas de saúde mental nas novas gerações, com grande aumento da depressão e ansiedade, e é notório um subdesenvolvimento humano, social e físico. Gerações que vivem sós, que comunicam pouco, que não se encontram. Concordaremos que não é uma forma saudável de crescer. Temos de recuperar a rua.

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