Quando soubemos que a nossa professora Fernanda Monteiro, professora de Português, já tinha solicitado a reforma e, em breve, iria terminar a sua carreira profissional, decidimos entrevistá-la para que nos contasse um pouco da sua vida.
Leonor (L): Professora Fernanda, ouvimos dizer que este ano se vai reformar… Conte-nos um pouco de si para que a possamos apresentar aos nossos leitores.
É verdade, tenho muito prazer em responder às vossas questões, então o que gostariam de saber?
Andreia (A): Nasceu aqui em Boticas?
Não. Eu nasci em Oleiros, Castelo Branco, mas fui com os meus pais com a idade de três anos para Lisboa e lá vivi e estudei até casar. Só quando me casei é que saí de Lisboa…
L: Tem filhos?
Tenho um rapaz com 35 anos.
A: Há quantos anos é professora?
Há quarenta e um anos…
A: [interrompemos com espanto] São muitos anos!
É, são muitos anos [a professora sorri]. É uma vida!
L: O que a levou a querer ser professora?
Eu, ainda muito novinha, gostava muito de brincar às professoras e, com as minhas amigas, eu era sempre a professora. Gostava muito de explicar, ensinar e essa paixão manteve-se à medida que o tempo foi passando. Além de que gosto muito de estar com os jovens, de explicar, conversar com eles, ensinar e contar histórias. Depois foi muito fácil, como eu já sabia a área que queria, quando acabei o “ano propedêutico” (ainda não se chamava décimo segundo ano) fui para a Universidade de Lisboa para ser professora…
A: Sempre se interessou pela área de letras ou foi assim uma escolha…
Eu, primeiro, andei um pouco perdida no período que se seguiu a o ciclo preparatório (agora é o segundo ciclo). Quando chegou a altura de escolher entre o Liceu e a Escola Comercial, os meus pais encaminharam-me para a segunda por entenderem que seria mais fácil entrar no mercado de trabalho. Andei então por áreas que não tinham nada a ver comigo, como a Matemática e o Cálculo Financeiro. Segui para a área de letras e para o português… e francês. Porque eu também sou professora de francês [nós não sabíamos]. Mas como agora, no segundo ciclo, os jovens não escolhem tanto o francês, tenho estado sempre a ensinar português.
“Ainda muito novinha, gostava de brincar às professoras com as minhas amigas”
L: Ao longo da sua carreira deu aulas em muitos lugares diferentes?
Alguns. Quando casei fui para Caldas da Rainha e estive lá cinco anos. Depois, o meu marido foi colocado nos Açores, na ilha de S. Miguel e lá estivemos, também, cinco anos. Finalmente, viemos para Boticas e aqui estou desde então.
A: Durante esta sua carreira de mais de 40 anos, houve alguma experiência particular que a marcasse e que queira partilhar connosco?
Pela negativa, não. Não posso dizer que tenha tido algum digno de registo! Pela positiva muita coisa, em especial a relação com as minhas direções de turma e com os alunos. De tantos episódios marcantes, recorda-me que fizemos em tempos uma atividade que era um cruzeiro pelo Douro (temos aqui na escola uma auxiliar que pertencia à turma que participou, vejam bem há quanto tempo foi). A experiência marcou-me pela reação dos alunos: adoraram. Nunca tinham saído de Boticas. Vejam, fomos da Régua ao Porto de barco, visitamos os monumentos do Porto, depois fomos ao shopping. Como [os alunos] nunca tinham andado numa escada rolante, passaram imenso tempo para cima e para baixo. Depois de passar a noite na cidade fomos à praia e regressamos de autocarro a Boticas. Foi tão marcante que eles falaram desta viagem durante anos.
L: A escola mudou muito desde que começou a trabalhar?
Sim, um pouco, principalmente no que diz respeito à exigência. Antes éramos muito mais exigentes. Para isso pode ter contribuído o facto de que agora é obrigatória para todos. Quando eu comecei a dar aulas só alguns prosseguiram estudos, geralmente aqueles que tinham menos dificuldades…
A: Isso dificulta a vida mais tarde, não é?
Sim e depois quando chegam ao secundário são necessários explicadores e, principalmente, tem de estar mais tempo a estudar. Esses hábitos são difíceis de ganhar, porque atualmente os meninos não querem trabalhos de casa, só querem fazer o mínimo, etc. Estudar não é fácil! Todas as profissões tem a sua dificuldade e ser estudante não é diferente. Ora, o que é que acontece: Os professor são menos exigentes, vocês cada vez vão estudando menos e quando chegam ao décimo ano o salto é muito grande e enormíssimo quando se passa à universidade, o que nem é bom falar. Mas olhem, nada que não se faça! Agora não se é menos esperto do que antigamente. Com esforço e com vontade tudo se consegue. Quando se quer muito uma coisa, acaba por se conseguir.
L: Vai ter saudades da escola?
Muitas, muitas… [a nossa professora emocionou-se com esta pergunta]
A: O que diria a um jovem que sonha ser professor?
Eu acho que as pessoas têm de fazer aquilo que gostam, isso é o mais importante. Cada um deve escolher o seu rumo dessa forma. É isso: Vejam bem o que gostam, porque agora tem 13, 14 anos e depois, enquanto trabalhadores, vão ter 13, mais 13, mais 13… e levar uma vida inteira a fazer aquilo que não se gosta deve ser horrível! Tem muitas ajudas, têm psicólogos na escola, testes psicotécnicos, orientação vocacional. Por isso aproveitam para serem bem orientados, para chegarem a uma profissão que realmente vos faça felizes.
Agradecemos imenso à nossa professora a entrevista que nos concedeu e, sobretudo, o muito que nos ensinou!
Conteúdo produzido pelo Agrupamento de Escolas Gomes Monteiro