Desde a Grécia Antiga, este ideal assenta na participação ativa dos cidadãos na construção do destino coletivo. O voto é, por excelência, o instrumento que transforma essa vontade em ação. Cada eleição representa uma oportunidade para renovar compromissos, corrigir rumos e afirmar a soberania do povo. Mas, infelizmente, não tem sido assim.
As eleições autárquicas de 12 de outubro deixaram marcas claras no panorama político de Vila Real e, por extensão, no resto do país. A fragmentação dos resultados, sem maiorias absolutas em várias freguesias, revelou uma nova realidade política: o poder local entrou numa era de equilíbrios frágeis e de negociações obrigatórias. Até aqui, nada de errado – é a democracia a funcionar. O problema começa quando a democracia é usada como palco para o bloqueio em vez de instrumento de governação.
Em teoria, a oposição tem uma função nobre: fiscalizar, propor alternativas e assegurar que as decisões tomadas sirvam o interesse público e não os interesses pessoais ou partidários. Na prática, porém, assistimos ao inverso. Multiplicam-se as alianças improváveis cujo único objetivo parece ser impedir o vencedor de exercer o mandato que o voto popular legitimou. Não se trata de diálogo ou de equilíbrio democrático; trata-se, antes, de uma espécie de “geringonça autárquica” improvisada, onde a soma das minorias se converte num veto permanente à governação.
Em vez de servir a população, muitos eleitos parecem ter transformado a governação local num campo de manobras partidárias. Em várias juntas, as oposições uniram-se apenas com o propósito de impedir o vencedor de constituir o executivo. O resultado é o mesmo em todo o lado: impasse, instabilidade e desgaste da confiança pública.
Perante este cenário, importa perguntar: falha a lei ou falham as pessoas? A legislação autárquica, com todos os seus limites, baseia-se na boa-fé dos eleitos. Confia que quem se senta à mesa da assembleia o faça em nome do bem comum. Quando essa boa-fé se perde, nenhuma lei é suficiente. A política transforma-se em teatro, e os cidadãos, que deviam estar no centro da ação, tornam-se meros espectadores de um espetáculo triste – o da paralisia institucional.
Vila Real, como tantas outras terras, precisa de líderes que saibam pôr o ego de lado e governar. Não basta ganhar eleições; é preciso saber construir pontes. E não basta ser oposição; é preciso ter sentido de Estado. A democracia não é uma arma para travar adversários, é um método para servir comunidades.
No fim, a questão não é jurídica – é moral. O verdadeiro teste da maturidade política está em saber perder com dignidade e vencer com humildade. Quando o poder é usado para bloquear em vez de governar, o que se perde não é apenas tempo: perde-se confiança, perde-se respeito e, sobretudo, perde-se o propósito da política – melhorar a vida das pessoas.



