Sábado, 7 de Dezembro de 2024
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Telemóveis nas escolas: Alunos querem liberdade total, professores e pais defendem travão

A utilização de telemóveis na escola não é consensual entre a comunidade. Se a esmagadora maioria dos alunos defende liberdade total, os outros agentes educativos defendem limites e regras, assim como os encarregados de educação.

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Há escolas que já proibiram o seu uso e que fazem um balanço positivo, uma vez que os alunos voltaram a brincar nos recreios.

A Escola Secundária de S. Pedro, em Vila Real, promoveu um inquérito junto da comunidade educativa para perceber qual a opinião dos diferentes atores sobre este tema e os resultados já são conhecidos.

Sobre a possibilidade de proibir ou limitar o uso de telemóveis em ambiente escolar, a maioria dos professores (60%) defende que deve ser limitado a determinados locais. Já 29% dos professores defende a proibição total, num universo de 93 docentes que responderam.

Já o pessoal não docente, das 39 respostas recebidas, 56% defende que deve ser limitado a determinados locais, enquanto 28% quer a proibição total.

“Nos intervalos temos a liberdade de escolher aquilo que queremos fazer. E devemos manter essa liberdade”
Matilde Rocha
Aluna

Os pais e encarregados de educação, das 409 respostas recebidas, 293 (59%) defendem que deve ser limitado a determinados locais. Há 81 (20%) que defende a liberdade total e 74 (18%) que gostaria que fosse proibida a sua utilização na escola.

Do universo dos alunos, a esmagadora maioria 79% (431) das 544 respostas recebidas querem uso sem quaisquer restrições, 12% (66) limitado a determinados locais e 6% (29) quer limitado a determinadas idades, enquanto apenas 3% (18) defende a proibição total.

INQUÉRITO

Até agora, na Escola Secundária de S. Pedro, o uso de telemóveis na sala de aula depende do professor, que o pode usar como ferramenta de trabalho. É isso que está estabelecido pelo conselho geral. Entretanto, a direção da escola sentiu a necessidade de regulamentar o seu uso no intervalo. 

“Aquilo que nos apercebemos diariamente é que o aluno tende a usar o seu telemóvel e não comunica. Não há sequer contacto visual entre eles”. Aliás, “muitas vezes, até comunicam entre eles, mas é através do telemóvel”. Por exemplo, “eles jogam juntos, estão juntos, mas, ao mesmo tempo, não estão”, explica a diretora da escola, Rita Mendes, adiantando que isso “é aflitivo”.

“Se eu fosse diretora de um agrupamento, não teria dúvidas em restringir por idades. Ou seja, até ao sexto ano, nada de telemóveis”. Agora, numa escola secundária “é muito mais difícil” tomar a decisão.

“No intervalo, devemos usar, até porque pode acontecer alguma coisa e assim sabemos logo”
Pedro Pinto
Aluno

“Decidimos avançar com um inquérito a toda a comunidade educativa, numa amostra que nos parece ser bastante interessante”.

Após as respostas recebidas, os alunos “responderam massivamente que querem liberdade total do uso. Os pais e encarregados de educação, assistentes técnicos e operacionais, professores, tendem a querer limitar aos espaços. Por exemplo, poderia ser autorizado em sala de aula, apenas como instrumento para aprendizagem”.

Rita Mendes refere que os alunos têm uma dependência social grande dos telemóveis. “Eles dizem que a sua vida em sociedade passa por este instrumento. O estarem contactáveis, em rede, em contacto com os outros, é através deste equipamento, que é o seu mundo”.

ALUNOS

A VTM falou com alunos, docentes, funcionários e encarregados de educação sobre esta temática, e obteve respostas surpreendentes, sobretudo dos alunos.

Matilde Rocha, do 11º ano, e representante dos alunos no conselho geral, foi taxativa e telemóveis só nos intervalos. “Dentro das salas de aula não. Ao entramos na sala, deveríamos colocar o telemóvel dentro de uma caixinha e no final podemos usar à vontade, já que no intervalo temos a liberdade de escolher aquilo que queremos fazer e acho que devemos manter essa liberdade”.

No secundário, os alunos “é que devem decidir a forma como o usam nos intervalos. Até porque, às vezes, estou cansada, não me apetece falar com ninguém e o telemóvel é uma espécie de refúgio”.

Outro aluno, Pedro Pinto, do 10º ano, também é favorável ao uso do telemóvel só nos intervalos. “Dentro da sala deveriam recolher os telemóveis, agora no intervalo, devemos usar, até porque pode acontecer alguma coisa e assim sabemos logo”.

“Eu só uso mesmo nos intervalos, mas prefiro ficar a falar com os meus colegas. Gosto de jogar em rede com eles e também vou às redes sociais ver as novidades”, revela Pedro Pinto, que quer seguir uma carreira no exército.

“Se fosse proibido usar, teria de me habituar, mas ia custar-me bastante”
Raquel Lopes
Aluna

Raquel Lopes, do 10º ano, assume que o telemóvel tem uma “grande importância” para poder estar sempre contactável. “Eu sei que há a secretaria para comunicar com os nossos pais, mas eu sinto necessidade de estar sempre em contacto com eles”. No entanto, “também usamos dentro da sala de aula, com autorização dos professores, para fazer pesquisas e para ajudar em algumas matérias”.

Se fosse proibido usar, “acredito que me iria habituar, mas ia custar-me bastante, porque sou um pouco dependente deste equipamento”, admite.

PROFESSORES

O professor Pedro Areias, de 62 anos, tem uma opinião equilibrada sobre esta temática.

“Sou um defensor do uso dentro da sala de aula, desde que o uso seja para consultar alguma matéria relacionada com a aula”. Por outro lado, admite, “também há abuso” com a sua utilização. “Os alunos perdem muito ao nível das relações interpessoais. Nos intervalos, vemos que cada um está com o seu telemóvel e não se veem os alunos a brincar. Perdeu-se este aspeto cultural, que faz parte da evolução humana”.

O docente, que dá aulas há 33 anos, é dos que deixa utilizar telemóvel na sala de aula.

“Os alunos perdem muito ao nível das relações interpessoais”
Pedro Areias
Professor

“Deixo usar para consultarem matérias, mas já apanhei alunos a usar o telemóvel para pesquisar outros conteúdos. Isso distrai-os e é prejudicial. Nestes casos, digo ao aluno para colocar o telemóvel dentro da mochila”.

Mas se fosse professor do primeiro ciclo admite que teria uma postura diferente. “Aí a melhor solução é mesmo não usar”.

Olga Carvalho, professora de biologia há 35 anos, sempre foi uma defensora das novas tecnologias e via o uso do telemóvel com muitas potencialidades pedagógicas. “Há variadas ferramentas que despertam o interesse para o conhecimento”, no entanto, o “avanço de novas plataformas que permitem o seu uso mesmo desligado para outros fins e não para aquilo que deveria ser, é uma preocupação para nós”. Pelo que, neste momento, “estou inclinada para não ser usado na aula. Ou seja, à entrada da escola fica o telemóvel, à saída da escola, o aluno utiliza. Temos de voltar a outros instrumentos, porque está a haver uma carência muito grande ao nível de relacionamento e de aproveitamento das situações pedagógicas, pelo que retirar seria mais benéfico para a aprendizagem dos alunos”, considera.

ENCARREGADOS DE EDUCAÇÃO

“É muito triste passar pelos corredores e ver os meninos agarrados ao telemóvel”
Susana Gama
Funcionária

Susana Gama tem um filho de 18 anos, que não é um adepto do telemóvel. Apesar de não ser contra o uso do telemóvel na escola, na sua experiência como funcionária vê com tristeza os meninos cada vez mais “agarrados” ao telemóvel.

“É muito triste passar pelos corredores e ver os meninos agarrados ao telemóvel. Não sou contra, mas acho que deveriam conviver mais uns com os outros, brincar, falar… Ainda há dias falava com uma colega e dizia que no nosso tempo lá andávamos nós com os joelhos arranhados. Hoje, sinto tristeza ao ver os miúdos muito agarrados ao telemóvel”.

Antes do início do ano letivo 2024/25, a Escola Secundária de S. Pedro vai reunir o conselho geral e decidir o que poderá adotar ao nível do uso ou não do telemóvel na escola.

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