Além do ex-presidente socialista, que liderou o município do distrito de Viseu no mandato 2009-2013, foram acusados o então chefe de Divisão de Manutenção de Serviços Urbanos e Obras Municipais da Câmara, a sociedade Montalvia, dois administradores (pai e filho) e um engenheiro civil desta empresa (que viria a ser o diretor da obra), e outro engenheiro civil, este externo à autarquia e que foi responsável pela fiscalização da obra.
Em causa estão crimes de corrupção ativa e passiva para ato ilícito de titular de cargo político agravado, fraude na obtenção de subsídio ou subvenção, prevaricação de titular de cargo político e falsificação de documento, relacionados com a empreitada de beneficiação e pavimentação da Estrada Municipal 512, entre a rotunda de acesso a Santa Leocádia e a Estrada Nacional 222.
O preço-base da obra foi fixado em 2,6 milhões de euros + IVA. Em maio de 2011, foi celebrado o contrato com a Montalvia para concretizar a empreitada por cerca de 1,6 milhões de euros. Submetida a fundos comunitários, a candidatura foi aprovada em reunião da Comissão Diretiva do ON.2 (Programa Operacional Regional do Norte).
No despacho de acusação, de 22 de outubro, o MP começa por descrever a “relação de proximidade” do ex-autarca com os dois empresários, citando a construção de um hotel na vila de Tabuaço, para depois sustentar que “todos os arguidos sabiam que na execução de empreitadas de obras públicas estavam obrigados a observar as regras de contratação pública previstas no Código de Contratos Públicos, nomeadamente o regime e limites previstos para a realização de trabalhos a mais e a menos”.
Acresce que o antigo autarca, o chefe de divisão e os dois administradores conheciam “os critérios de avaliação e aprovação dos projetos, o modo de funcionamento de cada subsídio e das condições de elegibilidade das despesas apresentadas em cada tipologia de fundo (comunitário) e operação”.
O MP relata, de seguida, as alterações ao projeto, começando com os “alargamentos pontuais” na Estrada Municipal 512, sendo que João Ribeiro e os dois empresários acordaram que as alterações fossem feitas sem mudar o projeto, “sendo o custo dos novos trabalhos a realizar saldado através do valor de trabalhos previstos no caderno de encargos que seriam suprimidos ou executados em menor quantidade”.
“Acordaram ainda os três arguidos que nos autos de medição ficavam a constar como executados todos os trabalhos do caderno de encargos, ainda que suprimidos ou executados em menor quantidade, sendo todos faturados e comunicados ao Programa Operacional Regional do Norte”, como se tivessem sido executados nos precisos termos do projeto, para que a comparticipação comunitária “fosse integralmente paga ao Município de Tabuaço”.
Desta forma, a autarquia “obtinha financiamento público a que não tinha direito”, beneficiando, também, a Montalvia, “uma vez que o dinheiro do subsídio se destinava ao pagamento das faturas emitidas e nas quais estavam incluídos trabalhos não realizados”.
Por outro lado, estes três acusados combinaram que “os trabalhos que seriam suprimidos e pagos à arguida Montalvia teriam um valor superior aos dos novos trabalhos acordados”, gerando um benefício económico para a empresa e os dois administradores, “correspondente à diferença entre o valor despendido em obra e o valor pago pelo município”.
Assim, acordaram verbalmente “um conjunto de trabalhos que seriam suprimidos ou executados em menor quantidade, nomeadamente ao nível da intervenção no pavimento na zona urbana de Adorigo, ao nível da sinalização, das obras acessórias e da execução de miradouros”.
Para compensar o benefício patrimonial que a empresa teria, os empresários “propuseram-se entregar ao arguido João Ribeiro, em numerário, uma quantia que lhe permitiria adquirir uma viatura da marca Mercedes, o que este aceitou”.
Apesar de ser do conhecimento do, à data, presidente da câmara, do chefe de divisão e dos responsáveis da Montalvia que as alterações ao projeto contratualizado tinham de ser comunicadas à autoridade de gestão do ON.2, nenhuma foi comunicada, mas foi “comunicado a esta entidade que tudo fora executado conforme o projeto de empreitada contratualizado”.
No documento em que são especificadas as alterações e omissões ao projeto, assim como a forma como alegadamente João Ribeiro recebeu o dinheiro para comprar um carro, o MP adianta que em 22 de maio de 2015, numa visita, os elementos da Comunidade Intermunicipal do Douro responsáveis pela verificação física da obra constataram “várias desconformidades entre a execução física e os elementos comunicados ao ON.2”, concluindo que não tinham sido executados trabalhos de valor estimado de quase 208 mil euros.
Elencando a atuação de cada um dos arguidos nesta empreitada, o MP, além dos crimes que imputa aos acusados, pede a condenação do ex-presidente da Câmara de Tabuaço, do então chefe de divisão, dos administradores e da empresa, e do engenheiro externo ao município que fiscalizou a obra na pena acessória de publicidade da decisão condenatória e na total restituição das quantias ilicitamente obtidas.
Ainda no caso de João Ribeiro, o MP solicita “a perda do mandato político” que exerça ou venha a exercer, bem como eventual declaração de inelegibilidade em atos eleitorais, enquanto ao chefe de divisão requer a “proibição do exercício das funções públicas”.
O MP pede ainda o pagamento solidário de quase 700 mil euros, verba na qual se inclui a vantagem económica entregue ao ex-presidente, valores de obras pagas e não executadas e de obras realizadas sem autorização, e do subsídio indevidamente atribuído ao município de Tabuaço (parte já devolvido ao ON.2).