Domingo, 13 de Outubro de 2024
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Não é defeito, é feitio – O impacto da urbanidade e ruralidade nos cuidados de saúde

A poucos dias de concluir a especialidade de Medicina Geral e Familiar (MGF), impõe-se uma reflexão sobre a realidade que vivemos e a que desejaríamos.

A poucos dias de concluir a especialidade de Medicina Geral e Familiar (MGF), impõe-se uma reflexão sobre a realidade que vivemos e a que desejaríamos. Trabalhar nos Cuidados de Saúde Primários (CSP) é escolher a medicina de proximidade: estar próximo da família, de todas as fases de vida, conhecer as dificuldades do doente; é trabalhar com todas estas variáveis além das que um sistema depauperado já inevitavelmente nos impõe. Ser médico de família (MF) é, num exercício de equilibrismo, oferecer os melhores cuidados possíveis, gerindo as suas expectativas e as do doente. E é por estas variáveis que os CSP se deveriam aproximar o mais possível da realidade em que se inserem. Cada doente deve ser abordado de forma individualizada, mas também como fruto da sua interação com o meio, sendo que desse modo o MF adapta a sua atuação para melhor responder à necessidade do doente. Também os CSP se devem adaptar às comunidades. Por mais vantajosa que seja a padronização de um sistema, dotá-lo de margem de flexibilização é potenciá-lo. Portugal é geograficamente pequeno, mas as diferenças demográficas entre regiões serão significativas ao ponto de as comunidades beneficiarem da adaptação dos CSP onde se inserem. Ser MF deve significar o mesmo em todo o país: a oferta da melhor qualidade humanística e competência técnico-científica assente na empatia. Mas isto não significa que o sistema deva ser o mesmo em todo o país. Uma população envelhecida necessitará de mais tempo por consulta; um idoso com dificuldade na mobilidade ou audição não deve ser prejudicado pela ditadura da padronização dos tempos de consulta, nem a imposição do cumprimento dos mesmos deve prejudicar o desempenho do MF; o surgimento da acessibilidade digital não pode esquecer uma população envelhecida, substituindo uma acessibilidade mais analógica, por vezes o único meio dessa população alcançar os CSP.

A urbanidade e a ruralidade não são qualidade ou defeito, são só características a respeitar. Ser médica de família em Santa Marta de Penaguião mostrou-nos a alegria de trabalhar com uma comunidade mais rural e envelhecida, mas trouxe também o dissabor das limitações impostas por um sistema que não está totalmente adaptado à comunidade. Não significa isto que o meio urbano elimine essas limitações; serão apenas diferentes, merecendo outras soluções. Fazemos esta reflexão no final desta etapa nos CSP, tentando de algum modo contribuir para a sua melhoria porque acreditamos que lutar pela mesma é também parte do compromisso que honrosamente assumimos quando escolhemos ser médicas de família!

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