Conta a tradição popular que o topónimo surge de um gesto de verdadeira amizade e lealdade, numa época em que as aldeias vizinhas viviam sob o peso de disputas e incertezas, “a pena” – termo que aqui significa “penhasco” ou “lugar alto” – tornou-se símbolo de abrigo e refúgio para quem, em tempos difíceis, procurava o apoio do amigo certo.
Assim nasceu o nome, representando, não apenas um local geográfico, mas um compromisso humano de ajuda e comunidade que ainda hoje vive nos seus habitantes.
Pertencente à recém-criada vila de Mouçós, Pena de Amigo é muito mais do que uma aldeia, é um retrato vivo da portugalidade rural, com tradições, memórias e uma identidade que se recusa a desaparecer. No entanto, este lugar cheio de alma enfrenta um desafio que não pode ser ignorado, o saneamento básico. Um pilar fundamental de dignidade, que tarda a chegar a esta aldeia.
É inacreditável aceitar que, em pleno 2025, algumas casas ainda dependem de fossas sépticas e estratégias improvisadas para gerir aquilo que deveria ser uma necessidade natural e garantida. O engenho local é grande, sim — mas não basta. Porque “a água vai onde a mandam”, e o saneamento precisa de chegar com investimento, planeamento e compromisso institucional.
A desertificação das aldeias não se vence apenas com discursos, vence-se com dignidade, e esta começa com as condições básicas de vida. Poder acionar o autoclismo “sem pensar duas vezes”, são direitos incontornáveis que refletem o respeito pelo território e por quem nunca o abandonou.
Pena de Amigo resiste. E resiste porque tem gente que ama a sua terra e cultiva a memória, que trabalha o campo e protege as raízes. Mas resistir não pode ser sinónimo de aceitar a falta do essencial. É preciso criar condições para que as gerações vindouras possam regressar e viver com qualidade. Porque ninguém escolhe voltar onde o básico é um luxo.
Esta luta não é por favores, é pela justiça territorial, pela equidade e pelo respeito à dignidade humana. No fundo, é garantir que o progresso alcance o último habitante tanto quanto o primeiro — o que deve ser um princípio inabalável para o Estado e para as entidades públicas responsáveis.
Não se trata de luxo. Trata-se de saúde pública, de justiça territorial e de respeito por quem nunca abandonou a terra que nos alimenta a todos.
Pena de Amigo não quer favores. Quer apenas o que faz falta. Porque o progresso não chega verdadeiramente a um território enquanto o seu último habitante não tiver, pelo menos, as mesmas condições de higiene que o primeiro.
Com tempo, esperança e compromisso, o nome desta aldeia poderá mesmo voltar a soar como um presságio positivo: “Pena de Amigo” — um lugar onde a amizade se traduz em cuidado, e onde o progresso caminha lado a lado com a tradição, garantindo que o essencial chega para todos, em plena justiça e dignidade.




