O tribunal ordenou a desocupação de 11 casas pertencentes ao Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) no bairro das Alagoas, na cidade de Peso da Régua. A ordem foi cumprida na quinta-feira (12), acompanhada por cerca de 60 militares da Guarda Nacional Republicana (GNR). Após a desocupação, as casas foram tapadas com tijolos e cimento, com as mobílias e outros bens a ficarem na rua.
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“Eles viviam todos juntos, em casas sobrelotadas. Com a pandemia, e tendo em conta que dessa forma não conseguiam garantir as condições pedidas pela DGS, falou-se com o IHRU e disseram que havia casas disponíveis, fechadas há cerca de 15 anos”, conta Alexandra Vagaroso, a advogada que tem acompanhado o caso.
As casas em questão, “estavam fechadas e a precisar de obras”, adianta, acrescentando que “estas famílias mostraram-se disponíveis para fazer as obras necessárias e a pagar renda”. Até hoje, “tentámos de tudo para que fossem encetados os contratos de arrendamento, mas nunca chegou a acontecer”.
Alexandra Vagaroso diz ainda que “os funcionários do IHRU vinham cá, sabiam que estas famílias estavam cá e agora acabaram por despejá-las”, conta, referindo que “isto é uma vergonha”.
DESALOJADOS
Tânia Soares é uma das visadas. Mãe de três filhos, de 5, 11 e 15 anos, garante que “não tenho para onde ir” e que “vou fazer aqui uma barraca”. “Estávamos aqui de forma ilegal sim, mas a pagar a água e a luz. Sempre quisemos pagar renda, mas nunca nos trataram disso”, salienta.
Outra das desalojadas é Janice Vicente. “Fomos avisados há coisa de duas semanas, pela proteção de menores”, conta, referindo que “não temos para onde ir. Os meus filhos vão para casa da avó, nós vamos para a rua”.
Também Daniela Ramos, que estava nesta casa há três anos, garante que “propusemo-nos a pagar a renda desde o início e o IHRU não aceitou. Tenho uma filha de três anos, que vai ter de ficar com os meus pais ou com os meus irmãos, mas eu não tenho para onde ir”. “Eu queria dar uma vida digna à minha filha, mas se não tenho para onde ir como vou fazer isso?”, questiona, reforçando que “há muito racismo aqui. Há uns anos tentei alugar uma casa, estava tudo certo, mas quando a senhora soube que eu era cigana, não avançou”.
Sem terem para onde ir, estas famílias vão viver na rua ou, no caso dos mais novos, para casa dos avós. Muito exaltada com a situação, Ludovina Carvalho vai acolher os três netos, mas “eu sou uma mulher doente, não tenho condições para cuidar deles”. “Nasci aqui, sou reguense e isto é uma vergonha. Podiam arranjar uma solução, eles estão dispostos a pagar uma renda”, acrescenta.
Ali ao lado, Alexandrina Pinto, de 54 anos, vive numa garagem há dois anos, com a filha e o neto. “Vivia numa casa, mas não tinha condições. O senhorio não quis fazer obras e eu tive de sair. Como não conseguia alugar casa, vim para aqui”, conta, explicando que “cozinho aqui, fazemos as necessidades para um balde e vamos buscar água à mina, com uns cântaros”. Com o despejo das casas vizinhas, Alexandrina teme que “também me tirem daqui”.
A advogada das famílias vai “deduzir as oposições para que possam entrar novamente nas habitações”. Contactada pela VTM, na terça-feira, Alexandra Varagoroso explica que “vão regressar às habitações o mais rápido possível. É algo que está previsto na lei e na Constituição Portuguesa. Podem lá estar até haver uma decisão final, o que pode demorar um ano”.
A representante das famílias refere, ainda, que a autarquia “prometeu arrendar as casas a estas famílias”, mas José Manuel Gonçalves garante que é “mentira”. “O que foi dito é que estaríamos dispostos a pedir ao IHRU que não tivessem de estar dois anos sem poderem ter acesso à habitação, fruto da ocupação que fizeram”, refere.
Segundo o presidente da Câmara de Peso da Régua, “queremos enquadrá-los na estratégia de habitação, onde já estão inscritas cinco dessas famílias, mas vão ter de seguir os tramites normais e ir para a lista de espera”.