Terça-feira, 10 de Dezembro de 2024
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Regionalização: Uma promessa que teima em não sair do papel

Começou a fazer parte da agenda política logo a seguir ao 25 de Abril de 1974. Era, à data, apontado como fator determinante para o desenvolvimento do país. Contudo, a um mês do 50º aniversário da Revolução dos Cravos, a regionalização continua sem sair do papel

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De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), Portugal é um dos países mais centralistas da Europa. A OCDE recomenda, mesmo, reformas que possam inverter esta tendência, mas a verdade é que a regionalização tem sido adiada pelos sucessivos governos.

O tema começou a ser debatido logo após o fim do regime de Salazar e Marcelo Caetano, que imperou no país durante mais de quatro décadas. Em 1976, Portugal preparava-se para votar a Constituição um documento que previa a regionalização, com o PSD a ser o partido que mais defendia essa reforma.

Mais tarde, em 1980, com Francisco Sá Carneiro a liderar o governo, falava-se na importância de uma “democracia regional”, mas do outro lado estava Mário Soares, que não era a favor da ideia.

Foi a partir da década de 1990 que a discussão em torno da regionalização em Portugal se intensificou e, em 1991, o governo da Aliança Democrática (AD), chefiado por Aníbal Cavaco Silva, aprovava a Lei-quadro das Regiões Administrativas.

Os anos que se seguiram ficaram marcados por um enorme debate em torno da delimitação de um mapa regional para Portugal. Na revisão constitucional de 1997, Marcelo Rebelo de Sousa, que liderava o PSD, impôs ao governo de António Guterres que o processo fosse levado a referendo.

Um ano depois, a regionalização foi mesmo a referendo. A proposta apresentada previa a divisão territorial defendida pelo PS, pelo Partido Ecologista os Verdes e pelo PCP em oito regiões: Entre-Douro e Minho, Trás-os-Montes e Alto Douro, Beira Litoral, Beira Interior, Estremadura e Ribatejo, Região de Lisboa e Setúbal, Alentejo e, por fim, Algarve.
Contudo, o referendo apresentado aos portugueses foi chumbado e rejeitado, com 60,67% dos votos contra e 34,9% a favor, sendo que a abstenção chegou aos 51,71%. Desde então, o assunto tem estado arrumado na gaveta, embora vá surgindo, aqui e ali, nos programas eleitorais dos partidos.

O QUE DIZEM OS AUTARCAS

São 35 os concelhos da área de abrangência do jornal A Voz de Trás-os-Montes, distribuídos por quatro Comunidades Intermunicipais: Alto Tâmega e Barroso, Douro, Terras de Trás-os-Montes e Ave (Mondim de Basto).

O que pensam os autarcas sobre a regionalização e o que trará de positivo para região?
Fernando Queiroga, presidente da Câmara de Boticas, é, atualmente, presidente da CIM Alto Tâmega e Barroso e acérrimo defensor da regionalização.

“Já é falada há muito tempo, mas, infelizmente, ainda não se concretizou”, lamenta, admitindo, ainda assim, que “não estão reunidas as condições para tal”.

Contudo, defende, antes de mais, a descentralização, embora o modelo atual, através das CCDR, não esteja a cumprir com as expectativas. “A experiência não está a ser boa. No caso da saúde, por exemplo, venderam-nos uma coisa totalmente diferente. Neste momento, os municípios são só uns porteiros, porque, em caso de nos faltar um médico, não temos poder para contratar outro, mesmo que seja por três ou quatro meses”.

Fernando Queiroga critica “o centralismo” e o “fechar de portas”, bem como a existência de “algum receio em passar competências”. E critica, também, o facto de “não haver uma delegação do ministério da Agricultura no nosso território, que vive muito deste setor”. O mesmo acontece no caso da saúde, onde ainda existem muitas dúvidas. “Eu estou à espera de assinar um protocolo do centro de saúde de Boticas e ninguém me sabe responder, nem a própria CCDR. Esta foi uma opção tomada para simplesmente entreter o Zé Povinho e que não vai resolver coisíssima nenhuma”.

“Sou a favor da regionalização, mas é preciso saber qual o modelo que está pensado”, frisa, defendendo que “não é preciso criar mais cargos porque existem as Comunidades Intermunicipais, dotadas de recursos humanos para assumirem muitas das competências.

A regionalização não pode ser sinónimo de mais encargos”.

Apesar de tudo, “o governo que tomar posse terá, no imediato, mais no que pensar do que na regionalização”, vinca.

Do lado da CIM Terras de Trás-os-Montes (CIM-TTM), Jorge Fidalgo também defende a regionalização, por considerar que “quanto mais próximos estivermos das populações e mais adaptarmos a legislação à realidade de cada território, só terá benefícios”.

E que benefícios seriam esses? “Depende das competências atribuídas a cada uma das regiões, algo que teria de ficar bem definido”, refere o presidente da CIM-TTM, indicando que, “no caso dos serviços públicos, seria importante termos mais autonomia na sua definição e manutenção”.

O também presidente da Câmara Municipal de Vimioso defende, ainda, “uma política fiscal diferenciadora em função das especificidades dos territórios e, acima de tudo, aproximar as decisões políticas das pessoas”, admitindo que “a legislação é igual para todos, mas não faz sentido em todo o território”.

Jorge Fidalgo critica “as decisões tomadas muito a nível central”, salientando que “o país é diferente de região para região e na mesma região há realidades diferentes”.

No seu entender, a regionalização só ainda não avançou “por falta de vontade política”, lembrando que “ela está inscrita na Constituição. Se cumprirem a Constituição, a regionalização avança”.

Mas, apesar de defender a regionalização, Jorge Fidalgo não é favor de serem criados mais cargos políticos. “Não pode, nunca, significar mais um cêntimo de despesa em termos do Estado”.

SER CONTRA

26 anos depois do referendo, o tema da regionalização continua a dar que falar. Será que se houvesse um novo referendo, o resultado seria diferente?

Uma recente sondagem feita pela SEDES (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social) revela que 81% dos inquiridos é a favor da regionalização por entenderem que “há mais poderes e decisões em Lisboa do que seria adequado” e 70% admite que Portugal precisa de uma revisão constitucional.

Mas se há quem seja a favor, há também quem seja contra. É o caso de Alberto Felícia, de Vila Real, que, “pela dimensão do nosso país”, entende que “não se justifica uma regionalização”.

“Sou contra e serei sempre. Em 1998 votei contra e se houver outro referendo voltarei a fazê-lo”, afirma, explicando que “a regionalização só iria criar mais um patamar político e mais despesa para o erário público”.

Além disso, “sempre tivemos uma tradição municipalista e não regional”, acreditando que “a competição é entre cidades e não entre regiões”. E mesmo com a regionalização, “vai haver sempre rivalidade, porque se criarem uma região Norte, vão sempre dizer que o Porto é que leva tudo”.

Alberto Felícia, acrescenta ainda, “na balança, os malefícios da regionalização vão pesar sempre mais”.

Num país como o nosso,
a regionalização não tem assim tanto cabimento”
CARLOS TEIXEIRA
CHAVES

Também Carlos Teixeira, de Chaves, defende que, “num país como o nosso, a regionalização não tem assim tanto cabimento” e admite que “cada região ter, à semelhança do que acontece em Espanha, um governo próprio, não me parece benéfico”.

O mais vantajoso, acredita, “é descentralizar, tirando muita coisa de Lisboa”, afirmando que “há situações em que o velho ditado que diz que Portugal é só Lisboa faz sentido” e admite que “o interior, em relação ao litoral, está muito esquecido”.

A VTM contactou a CIM Douro para obter uma posição sobre o tema, mas até ao fecho da edição não teve resposta.

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