Nem todos os lugares povoados, como nem todos os tempos, se podem vangloriar desses privilégios. Mas Vila Real é uma exceção na viragem do século e do centenário da Diocese.
Refiro-me, objetivamente, a João Parente. Ainda está por cá e, felizmente, com invejável frescura física e mental. Tive a sorte de o acompanhar, nos três recreios e corredores do Seminário, nos mesmos espaços e, quase sempre, com todos os professores, durante dez anos. (1952 a 1962). Nunca fui bom aluno. Mas, pela vida fora, sempre tive orgulho em todos aqueles que conheci, debaixo do teto do antigo Convento de Stª Clara. O Padre João Parente gastou todo o seu fulgor a trabalhar pelos seus condiscípulos, discípulos, amigos, paroquianos e quantos a ele recorriam, como alunos, ou meros aprendizes, de áreas culturais, como a arqueologia, etnografia, etnologia, numismática, mineralogia e afins. Foi mais do que um professor dessas áreas do saber. Foi um apaixonado, um colecionador, um investigador, um comprador de tudo aquilo que, peça a peça, pode ser motivo de atração; mas que num conjunto, devidamente identificado, legendado e explicado pode constituir uma exemplar fonte de formação. Ora João Parente chegou a comprar um jipe para deslocações a sítios inacessíveis a viaturas de cidade, sempre com o espírito de enriquecer coleções com peças raras e em perigo de se perderem. Fez isso com selos, com pedras valiosas, com vasos em granito trabalhado, epigrafias. Preparou, recolheu vestígios e alojou cada coisa no seu sítio com os recursos próprios.
Se procedeu assim com o espólio museológico para oferecer à cidade e a toda a população que pretendia reforçar conhecimentos, alargou o gesto mecenático à produção de obras históricas que só pessoas amigas do saber e do ensinar, são capazes de produzir e disponibilizar a preços de chuva.
Há cerca de um mês mencionei dele um volume de 450 páginas, a cores, com o repositório das Alminhas em todos os concelhos do distrito de Vila Real. Conheciam-se algumas monografias. Mas não um levantamento científico como este, que irá ser muito útil a docentes e discentes da etnografia. Desta vez trago ao conhecimento dos leitores quatro volumes, em capa dura, somando 2984 páginas, todas com o latim da época medieval, página a página, ao lado do português correto e muito útil para investigadores sobre a Idade Média. Logo na introdução do I volume recorda que por Idade Média se deve entender «o período cronológico de cerca de mil anos, balizado entre a Invasão dos Bárbaros, no começo do século V e a queda de Constantinopla, em 1453, ou os Descobrimentos, feitos pelos Portugueses, no século XV». Obra monumental de um vila-realense que enriqueceu a cidade, dando-se e dando o suor do seu saber.