Terça-feira, 21 de Janeiro de 2025
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Adérito Silveira
Adérito Silveira
Maestro do Coral da Cidade de Vila Real. Colunista n'A Voz de Trás-os-Montes

Histórias de bandas que não mais se repetem – Um cabrito para dois

Numa festa, não longe de Chaves, calhou a dois músicos da Banda de Mateus em sorte um “patrão” onde o cabrito era rei e senhor; um prato sempre apetecido mas que nas famílias dos músicos poucos se gabavam de saborear durante o ano.

Só o cheiro à entrada levou os dois artistas a fecharem os olhos, inebriados pelos aromas da comida. A santa missa tinha sido participada pela banda de música e a homilia prolongou-se no tempo porque o padre entusiasmou-se com a igreja a abarrotar de fiéis, coisa que raramente acontecia. E foi preciso o sacristão fazer um sinal ao ministro de Deus para terminar o sermão. Depois veio a arruada fatigante de vários quilómetros. O apetite era pois devorador. Já com a mesa posta, António Silveira, músico do bombardino, em má hora decide ir à casa de banho apertado de vontades. Demorou mais tempo do que desejava, sabe-se lá porquê.

O saxofonista, António Matos- Meco aproveitando a ausência do colega entrincheira-se no cabrito com avidez. E na loucura do apetite, o animal quase desapareceu, ficando dele o cachaço e a cabeça com os olhos ainda bem arregalados.

Quando o músico do bombardino chega, fica assarapantado e de imediato protesta: “ó Meco foste tu que fizeste este lindo serviço”? – Pois você nunca mais chegava da casa de banho! Até pensei que não tinha fome”. Entretanto, nos lábios do Meco bailava-lhe um sorriso matreiro, enigmático.

O patrão apercebendo-se da malandrice do “Meco”, manda a sua Custódia trazer dois galos gigantes bem tostadinhos e coloca-os à frente do músico descontente. Este, sentencia: Ó Meco, nestes dois, tu não lhe mexes, nem sequer nas asas lhe pões os dentes.

A patroa Custódia tinha no forno outro cabrito para a noite e antecipa-se a levar ao músico do bombardino uma boa coxa de cor bem bronzeada.

Feitas as contas, António Silveira e António Meco saíram dali com o estômago bem atestado. A satisfação era total pela expressão luzente dos olhos. O cabrito no forno esperava por eles à ceia. Seguramente nenhum por precaução iria à casa de banho. E à noite, já com o cabrito na mesa, António Silveira lança o desafio: “Ó Meco não queres ir à casa de banho”?

Resposta pronta: “Nessa não caio eu”.

Já a caminho do coreto para o arraial, passaram perto de um charco de água e ouviram uma rã a coaxar, respondendo-lhe outras, aquele bocadinho de música embebedava-os de prazer. Ser músico era uma bênção, uma paz como o fruir do alvor melancólico de lua cheia. Ser músico de bandas era também muitas vezes o procurar os sons que acalmavam as dores, afagavam o sofrimento e faziam esquecer os martírios da vida.

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