Quarta-feira, 21 de Maio de 2025
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Daniel Conde
Daniel Conde
Fundador do Movimento Cívico pela Linha do Tua

Siderodromofobia

A desfaçatez com que o cabeça de lista do PS por Vila Real às próximas legislativas, o autarca em fim de mandato Rui Santos, agita a bandeira da defesa da ferrovia, é quase cómica. Contudo, deixá-la passar em branco seria um mau serviço prestado à comunidade e à nossa democracia, pelo que esclarecerei o quão vazia é esta “defesa”.

Elaborei há alguns anos um estudo preliminar da reabertura da Linha do Corgo, no troço Régua – Vila Real – Abambres, desconstruindo os valores absurdos avançados pela REFER após o encerramento desta linha em 2009, e também o mito de que linhas como esta estão condenadas a serem deficitárias, ao expandir o desinspirado modelo de exploração promovido pela CP. Enquanto munícipe vila-realense, solicitei por diversas ocasiões ao longo de anos uma audiência ao autarca para lhe apresentar este estudo; nunca aceitou receber-me.

Em Novembro de 2022 era publicado o Plano Ferroviário Nacional (PFN), o qual inclui a Linha do Corgo para estudo de reabertura integral, da Régua a Chaves. Solicitei várias vezes ao “defensor da ferrovia”, no decorrer dos meses seguintes, qual era a sua posição sobre este desenvolvimento; a resposta nunca chegou.

Em Fevereiro de 2023, confrontado pela comunicação social, afirmou aliás que a viagem de comboio entre Vila Real e a Régua levava “mais de uma hora” (o que é falso), e ignorando completamente tanto as valências intrarregionais do transporte ferroviário no dia a dia das populações, como todo o troço de 71 km a Norte de Vila Real. Tem sido também notória a postura de ignorar ostensivamente as várias reclamações veiculadas pelos autarcas de Nogueira e Ermida, e de Alvações do Corgo, de que os autocarros de substituição do comboio têm prestado um mau serviço, sobretudo quando comparado à oferta ferroviária de que foram privados.

Mas o cenário fica ainda pior. Após o anúncio da inclusão da Linha do Corgo no PFN, a autarquia a que preside avançou com a ocupação do canal ferroviário dentro da cidade com uma caríssima ciclovia, não se coibindo até de demolir um edifício na estação que em nada atrapalhava à passagem da mesma. Mantém mesmo a pretensão de a expandir até à Régua, num exercício de total atropelo ao PFN – e por extensão, à sociedade civil portuguesa, que o elaborou, à Assembleia da República, que o recomendou, e ao Governo, que o aprovou.

Tampouco se lhe consegue distinguir uma intervenção activa no que concerne à Linha de Alta Velocidade (LAV) Porto – Vila Real – Bragança: no mesmo ano em que no distrito de Bragança se promoveram três debates públicos com apoio de autarquias locais, num dos quais fui orador, no distrito de Vila Real contabilizei zero. Já sobre a Linha do Douro, e no seio da CIM Douro, na qual se inclui a autarquia de Vila Real, a sua postura tem sido reiteradamente de ignorar a Linha do Corgo. Segundo esta entidade, o seu “foco” está na Linha do Douro – um foco bem pouco luminoso, a julgar pelo atraso de 6 anos na electrificação até à Régua, e na periclitante prossecução da reabertura a Barca d’Alva, aprovada no Parlamento num já distante 2021…

Chegados a 2024, e em Janeiro promovi não apenas um debate sobre a Linha do Corgo, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro – o autarca foi convidado; nunca recebi resposta – como lancei uma Petição pela Reabertura da Linha do Corgo, para a qual solicitei colaboração a todas as autarquias servidas pela mesma, tanto na sua divulgação como na sua disponibilização em papel aos cidadãos, a partir de Outubro.

O “defensor da ferrovia” não respondeu a um único dos inúmeros emails subsequentes, enviados a todas as autarquias, dando conta do andamento da recolha de assinaturas, e finalmente da entrega e admissão da Petição na Comissão de Economia, Obras Públicas e Habitação, entre 15 de Fevereiro e 12 de Março, com mais de 1000 assinaturas. A autarquia por si presidida não ajudou na divulgação da Petição, como fizeram mais de uma dezena de outras no território, nem quis disponibilizá-la em papel ao público, como fez por exemplo a Junta de Freguesia da cidade.

Só numa realidade absolutamente paralela e distópica é que Rui Santos se pode arvorar em defensor da ferrovia. Se algo de remotamente ferroviário se lhe pode reconhecer com certeza, é uma notória siderodromofobia*. Agite as bandeiras que quiser na campanha eleitoral: não tem propriedade para usar esta.

*medo doentio aos caminhos de ferro

“O autor escreve segundo o antigo acordo ortográfico”

 

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