Terça-feira, 19 de Março de 2024
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João Ferreira
João Ferreira
Investigador, Professor do Ensino Superior

Quem não acredita no desenvolvimento do interior (II)?

A pretexto da polémica acreditação do novo curso de Medicina no Porto, escrevi aqui (www.avozdetrasosmontes.pt/quem-nao-acredita-no-desenvolvimento-do-interior/) sobre as lógicas perniciosas do pensamento a que chamei de “metropolitano”, e que acredito têm contribuído para o empobrecimento do País.

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Escrevo agora no dia seguinte à greve dos Médicos e por força dos acontecimentos volto, como prometido, a este assunto.

Os médicos têm muitas reivindicações, mas suspeito que as mais importantes são a atualização das tabelas salariais, a diminuição de 40 para 35 horas de trabalho e a redução do trabalho em serviço de urgência de 18 para 12 horas. Em suma, ganhar mais e trabalhar menos. Acresce que muitos médicos consideram que, por variadas razões, as condições de trabalho nos hospitais do SNS se têm degradado ao longo dos últimos anos. É por isso que muitos médicos vão trabalhar para o privado ou emigram. Querem uma prova? Em Portugal muitas vezes abrimos concursos para contratar médicos e acabamos a não preencher todas as vagas, principalmente no interior.

E então, porque é que não pagamos melhor aos médicos? No geral, suspeita-se que este e os anteriores Governos não tenham querido aumentar o valor das despesas estruturais com que se comprometeram com os seus parceiros da União Europeia. O problema é que para garantir o funcionamento do SNS tiveram de aumentar as despesas transitórias, chamadas de extraordinárias, contratando médicos conhecidos como tarefeiros.

Contratados à hora e a peso de ouro, servem para suprimir as faltas de pessoal. Pelo mesmo trabalho, um médico tarefeiro ganha mais que um médico a tempo inteiro. Uma solução que deve criar um péssimo ambiente nos serviços hospitalares e que, efetivamente, não diminui os gastos com a saúde. Acresce que estas despesas extraordinárias, de tão prolongadas no tempo, estão a tornar-se de facto estruturais. Um ciclo sem virtude e sem fim à vista.

Mas como é que se consegue contratar médicos e acabar com a dependência nos tarefeiros? Primeiro, aumentando o número de médicos recém-formados, abrindo mais Faculdades de Medicina, incluindo na UTAD, e capacitando mais hospitais para poderem ter as idoneidades formativas necessárias para formar os especialistas que o país necessita. Depois, criar um modelo de incentivos para que os médicos se fixem no interior. Se assim for, a redução de gastos com os tarefeiros poderá criar folga financeira suficiente para os aumentos salariais que os médicos pretendem e talvez responder a mais algumas das suas reivindicações.

As mais recentes promessas de aumentar o número de cursos de medicina e as novas regras para as ordens profissionais, incluindo a Ordem dos Médicos, que atribui as idoneidades formativas, parecem indicar que o Governo tem a intenção de mudar o rumo. Mas agora imaginem que isto se tinha feito há umas décadas atrás, os problemas que tínhamos poupado! E mais não digo.

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