Se não respeitarmos as revisões de um carro, facilmente se vai abandalhar, vai começar a ter precocemente avarias, e terá um tempo de duração muito limitado. A nossa vida também, todos os anos, precisa de ir às “revisões”, porque pode facilmente cair na frivolidade e na incoerência, desviar-se da vivência que projetou e dos compromissos que assumiu. A Quaresma é esse tempo oportuno e favorável para se fazer uma profunda revisão de vida e se voltar a encontrar as coordenadas do GPS que nos ligam e levam a Cristo, ao seu Evangelho e ao seu reino. Possivelmente, andamos muito preocupados com o “nosso” reino, andar por aí só preocupados com o nosso bem-estar, em dar nas vistas, ter poder e dominar, ser influentes, ser famosos, causar impacto, em nos projetarmos sobre os outros, em aparecer, nem se seja de forma artificial e ridícula, em causar sensação e dar espetáculo.
A quem me manifesta que não tem pecados e que não precisa de conversão, ao contrário dos outros, como sempre, dou o exemplo daquela pessoa que se sente muito bem de saúde e não sente necessidade de ir ao médico. Devido à insistência da família e dos amigos, resolve ir ao médico e fazer umas análises, e eis que é surpreendido: tem a tensão alta, colesterol alto, possível gordura no fígado, a glicose está no limite. O médico profere o diagnóstico: tem de mudar de vida. É preciso arrepiar caminho. Há doenças que são silenciosas. O mesmo pode acontecer na vida de um cristão. Silenciosamente e sem parecer que não tem mal nenhum, muitos maus hábitos, vícios, valores mundanos, acomodamentos, formas de pensar, rotinas, desleixos, omissões se apoderam da vida e a tolhem e limitam, enfermando a alma e o coração, e nos desviam de um caminho e ideal que abraçamos.
O homem atual precisa de recuperar rapidamente a interioridade. A Quaresma também é para isso. Voltar à boa espiritualidade e dar atenção à vivência interior. É ali que tudo começa e tudo acaba. Vivemos muito voltados para fora, nesta sociedade das aparências, da febre mediática e do espetáculo, do atuar e impressionar mais do que ser, mas por dentro sente-se que as pessoas estão muito caóticas e desestruturadas. Não podemos viver apenas centrados nos bens e nas preocupações materiais, nos êxitos instantâneos e fugazes da vida mundana, mas temos de nos centrar mais na interioridade, nos valores espirituais e na busca de Deus.