Domingo, 13 de Outubro de 2024
No menu items!

A Comissão à ausência de vergonha

Ao longo das últimas semanas vimos assistindo às sucessivas audições dos alegados maiores devedores do Banco Espírito Santo (actual Novo Banco)

Instituição bancária essa, resolvida por decisão do Banco de Portugal em 3 de Agosto de 2014 e, no caso o Novo Banco (à época denominado como o “Banco Bom”), desde logo capitalizado pelo Fundo de Resolução (entidade financiada pelos bancos, entre os quais o público CGD, que está na esfera do Estado e consolida nas contas públicas) com 4,9 mil milhões de euros.

Mais tarde, em Outubro de 2017, seria concretizada a alienação a um fundo de investimento norte-americano (o Lone Star) de 75% do Capital Social do Novo Banco, mantendo o Fundo de Resolução bancário 25%. O Lone Star não pagou qualquer preço (tendo injectado 1000 milhões de euros no Novo Banco), tendo ainda acordado um mecanismo pelo qual até 2026, e com um limite de 3890 milhões de euros, o Fundo de Resolução compensa o Novo Banco por perdas num conjunto de activos que ponham em causa os rácios de capital.

Esta breve, mas enfadonha súmula de todo o processo de resolução do Banco Espírito Santo (originando o Novo Banco) e da venda do Novo Banco ao Lone Star, não pretendendo ser exaustiva, almeja ilustrar que durante todo este processo foi o Estado, todos nós, através do Fundo de Resolução, que possibilitou que ainda hoje o Novo Banco esteja a laborar. A laborar, diga-se, mesmo depois de um sangrento processo de rescisões e reformas antecipadas de cerca de 400 trabalhadores, atirando para a rua, sem qualquer responsabilidade social, recursos humanos com anos de experiência no sector bancário.

Foi, pois, com o objectivo de apurar as causas para as perdas do Novo Banco (imputadas ao Fundo de Resolução) que foi constituída, pela Assembleia da República, uma Comissão Eventual, chamando à Casa da Democracia os principais devedores e protagonistas de todo este processo.

O que se tem assistido nestas primeiras audições não é uma simples tentativa de fuga às responsabilidades (que até seria juridicamente aceitável). Temos, colectivamente, assistido a um completo despudor, uma verdadeira ausência de vergonha. Como podem todas estas personalidades ter, alegadamente, movimentado centenas, milhares de milhões de euros e nada saberem, sobre nada terem responsabilidade e, acima de tudo, ainda se considerarem credores perante a Assembleia da República e o Sistema Bancário?!

Esta Comissão coloca uma vez mais a nu uma triste realizada da História de Portugal: a fragilidade da nossa classe empresarial de topo, sempre dependente por um lado do favor do Estado e, por outro lado, da simpatia da Banca. Não constituindo este facto uma novidade, o que se assume como gritante é a desfaçatez de todos aqueles que foram até agora ouvidos pela Comissão Eventual, destratando inclusivamente os Deputados (eleitos pelo Povo) redundando numa triste realidade: os trabalhos desta Comissão assumem-se mais como uma Comissão à Ausência de Vergonha.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia

OUTROS ARTIGOS do mesmo autor

Górgias actual?

SNS: Os verdadeiros heróis

Presidenciais 2021

NOTÍCIAS QUE PODEM SER DO SEU INTERESSE

ARTIGOS DE OPINIÃO + LIDOS

Notícias Mais lidas

ÚLTIMAS NOTÍCIAS