Sexta-feira, 13 de Dezembro de 2024
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Ernesto Areias
Ernesto Areias
Advogado. Colunista de A Voz de Trás-os-Montes

Fadiga democrática

O crescimento da abstenção nos atos eleitorais tem vindo a agravar-se, devendo merecer preocupação de todos os que acreditamos na democracia.

Creio que deve ser ponderado se em vez de o voto ser um dever cívico não deverá ser um dever jurídico que apenas exclua da obrigatoriedade os maiores de 80 anos, os doentes e outros por justificadas razões.

 Quem reiteradamente não participa na vida democrática e nos atos eleitorais deve ter a coerência de não exigir, não criticar e abster-se de pensar que a democracia é uma realidade conquistada de forma definitiva

Está hoje instalada uma praxis negacionista, de ódio e justicialista que vai fluindo como o Letes, rio mitológio de sombras que corre pelas entranhas do inferno, através das redes sociais onde toda a gente tem opinião sem o adequado conhecimento.

Opinar sobre a vida coletiva e assuntos de Estado, sobre temáticas que não conhecemos, dossiês complexos a que não tivemos acesso deve merecer sensatez e estudo e a recolha de informação.

Por causa desta corrente de abstencionismo, o Reino Unido saiu da União Europeia e milhões de cidadãos tiveram e têm de suportar chefes de governo que, seguramente não queriam.

Outra ideia perigosa é a igualação pela negativa, ou seja, a ideia, de que os políticos são todos incompetentes, todos corruptos e ladrões, todos a mesma choldra. Não é assim. Não tomemos a nuvem por Juno porque a maioria dos políticos são pessoas conhecedoras, sensatas que abdicam do seu bem estar e da família em benefício do bem comum.

Num exercício de ficção política, o escritor francês Michel Houellbeck na sua obra Submissão, antecipou o que poderá constituir uma vitória das forças do partido da Irmandade Muçulmana depois de derrotar a Frente Nacional. 

Depois de o escritor se afastar dos tumultos que decorriam na capital, quando regressou, França estava irreconhecível.

Vem isto a propósito da transferência da vida política para os reality shows, como se a seriedade e exigências que a maior das artes, a política, fosse compaginável com populismos bacocos a que dão corpo líderes autocráticos, cegos pelo poder e a escravização do povo.

Há, hoje, o reavivar de forças xenófobas, nacionalistas, racistas que violam o princípio da igualdade consagrado na nossa Constituição. É de pasmar quando verificamos que uma parte significativa das suas propostas seriam chumbadas pelo Tribunal Constitucional por violação das mais elementares regras da vida democrática.

Entendemos que a complexidade da sociedade atual, da era digital, da informatização da produção, da omnipresença das tecnologias da informação tenha excluído muitos cidadãos do acesso aos meios de produção e ao emprego.

O saber exige esforço, seja em que área for, a competência reclama empenhamento e o acesso aos melhores empregos, dedicação e demonstração de capacidade.
Temo que sejam os deserdados da globalização, os infoexcluídos, os que não deram um salto de formação por falta de empenhamento, condicionem o futuro das sociedades, porque o voto de um ignorante e o de um sábio valem o mesmo. 

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