Sexta-feira, 6 de Dezembro de 2024
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António Martinho
António Martinho
VISTO DO MARÃO | Ex-Governador Civil, Ex-Deputado, Presidente da Assembleia da Freguesia de Vila Real

“Hay Gobierno? Soy contra!”

É muito provável que, quando este Visto chegar aos leitores, ainda não haja sequer Primeiro-Ministro indigitado pelo que não haverá risco de confusão com tal grito revolucionário atribuído aos anarquistas.

Mas semana e meia depois das eleições legislativas, convocadas não se sabe bem a que título constitucional, parece muito a propósito lembrar este dito, normalmente, recebido com um certo sorriso.

Se nos dermos ao trabalho de uma reflexão sobre os resultados eleitorais, quando havia quem pedisse normalidade nas condições de governabilidade, depressa se concluirá que nada se adiantou nesse domínio. Partido, melhor talvez, espartilhado como se prevê que fique o hemiciclo de São Bento, falar de governabilidade pode ser uma utopia distante. Há, contudo, quem persista em valorizar uma atitude de certo eleitorado que se considera ter sido levado pela vontade de protestar contra o que existia, o Governo de então, por não verem satisfeitas suas vontades corporativas. Dão razão ao título: «Soy contra!». Alguns títulos da imprensa dos dias seguintes ao ato eleitoral são elucidativos: «Ficámos assim a saber que há um milhão de portugueses que são do contra» – Público de 12 de março; «Hoje começou a mudança que o país precisava há 50 anos», André Ventura em ZAP; «Tempos incertos» – RTP (newsletter); «Um país à beira de um ataque de nervos» – Expresso curto de 11 março. Distanciando-se desta explicação do “protesto” pude ler uma outra que Vicente Valentim expõe no âmbito de um estudo de pós-doutoramento que está a levar a cabo na Universidade de Oxford. Para ele, “estas eleições portuguesas realçam uma tendência comum na Europa: o apoio à extrema-direita cresce muitas vezes muito rapidamente. Ora, como as pessoas não mudam de ideia tão rapidamente, será de concluir que as pessoas já tinham opiniões de extrema-direita, mas não as expressavam porque temiam o ostracismo social”. E ilustra com vários gráficos relativos a vários países, entre outros, Hungria, Suécia, Países Baixos, Espanha e Portugal.

E agora, José?… Afinal, o José continua a ser o mesmo, o que hoje interpelamos, ou o de Carlos Drummond de Andrade, nos longínquos anos de 1942! Será que estamos num momento onde imperam a “solidão e falta de rumo”, ou continuamos convencidos que a democracia continua a ser o melhor sistema de organização política? Aquela que o 25 de Abril nos trouxe. Da opção que fizermos, dependerá muito o nosso futuro coletivo.

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