Terça-feira, 18 de Março de 2025
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Ricardo Almeida
Ricardo Almeida
Professor e Empreendedor Social

O erro de Rawls e Kant

A ideia de democracia liberal, uma democracia representativa, como modelo político universal trata-se de uma criação moderna que, apesar de influências da Antiguidade ateniense, tem a sua génese no Ocidente na transição do século XVIII para o século XIX.

A “exportação” deste modelo liberal e o aprofundamento dos seus princípios daria a possibilidade, segundo o famoso filósofo americano John Rawls, de sociedades liberais promoverem a estabilidade necessária para a Paz democrática. A estabilidade poder-se-ia distinguir em dois tipos, em primeiro lugar, pelas razões certas, quando os cidadãos expandem um sentido de justiça desenvolvendo, assim, um ideal de conduta e, em segundo, pelo equilíbrio de forças, quando os interesses que movem os povos são razoáveis e guiados por uma equidade e respeito por todos. Mas o interessante deste pensamento é o relacionamento com os povos não liberais, onde a necessidade de uma conceção de tolerância tem como princípio orientador a “liberalização” de sociedades que ainda não o são, até que, no caso ideal, todas as sociedades se tornem liberais. A ideia de paz democrática de Rawls é uma resposta à teoria realista segundo a qual as relações internacionais não se alteraram desde a época de Tucídides e que continuam a ser uma luta permanente pela riqueza e pelo poder.

A metamorfose abrupta da Ordem Internacional Liberal (OIL) é tal que o seu grande entusiasta e impulsionador, os Estados Unidos da América (EUA), atua, hoje, como o grande desestabilizador, apoiando uma política internacional de busca de domínio e glória, onde a razão da conquista e o prazer do exercício do poder sobre os outros justificam claramente a motivação para a guerra.

O grande erro das democracias liberais foi acreditar que a pacificação se garantia apenas pelo comércio, pela economia de mercado, que a destruição das ideologias totalitárias eram esmagadas pela atratividade de um modus vivendi balizado por princípios democráticos que aos nossos olhos são a normalidade do usual quotidiano.

Se em 1939, Winston Churchill referia-se à Rússia como uma charada envolta num enigma dentro de um mistério, transparecendo a complexidade quanto ao seu funcionamento interno e à sua atuação na política internacional. O registo histórico recente da conduta da Rússia de Putin previa uma visão imperialista e autoritária, sendo expectável a sua rejeição ao modelo liberal. O preocupante foi a inação, a subserviência e a hipocrisia da União Europeia (EU), que fizeram deste caminho um perigoso recuo, um telefonema de uma hora e meia, demonstrou a sua impotência e um possível abandono do panfleto idealista de Immanuel Kant sobre a paz perpétua de 1975, a mesma que inspirou profundamente as democracias liberais, a UE e o Direito Internacional.

O realismo político leva-nos a perceber que se aproxima a queda da Ucrânia para o inferno da derrota.

Oxalá Kant e Rawls estejam certos.

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