No ano seguinte, os portugueses, através de uma campanha criada por jovens, levaram a efeito uma ação que muito irritou a Indonésia: a “Missão Paz em Timor”. Corria-se o perigo de uma guerra, sustentada pelos indonésios. Um barco (o “Lusitânia Expresso”) avançara da cidade australiana de Darwin, no dia 29 de fevereiro, com um simples objetivo: denunciar ao mundo o criminoso ato que tinha acontecido, atracando em Timor e colocando ramos e coroas de flores no cemitério onde tudo tinha acontecido, homenageando os que ali morreram e foram sepultados e apoiando os que ofereciam resistência aos desejos indonésios que tinham anexado o território timorense. O navio levava 87 elementos, entre eles o antigo presidente da República portuguesa António Ramalho Eanes.
“ÁGUAS INDONÉSIAS, VÃO-SE EMBORA!”
Em 10 de março de 1992, o “Lusitânia Expresso” aproximou-se das águas territoriais de Timor Leste, mas foi surpreendido pela hostilidade do governo indonésio que as ocupava.
“Cumprindo as insistentes ameaças, a Indonésia fez guerra à “Missão Paz em Timor” ordenando, através de uma das suas fragatas, a paragem do “Lusitânia Expresso”, mal o navio entrou em águas territoriais de Dili – eram 22h05 horas em Portugal. Objetivo gorado o da ida ao cemitério de Santa Cruz (que ficou a escassas 10 milhas), mas a operação foi, indiscutivelmente, um êxito de mobilização mundial a favor do massacrado povo maubere”
(“Jornal de Notícias” de 11 de março de 1992)
Antes, já o presidente da República de então, Mário Soares, manifestara preocupação sobre a eventualidade de uma reação agressiva da Indonésia à missão do “Lusitânia Expresso”. Recordando advertências que havia feito aos jovens promotores da iniciativa – cuja coragem elogiou – Mário Soares dissera que “a Indonésia está numa posição de grande debilidade e os débeis são agressivos”.
FLORES SOLIDÁRIAS NAS ÁGUAS SOLITÁRIAS
Em texto de primeira página, na sua edição de 11 de março de 1992, o jornal “O Primeiro de Janeiro” que à data se publicava no Porto, referia que a paragem do barco da Missão não tinha sido uma derrota:
“O Lusitânia Expresso deu ontem como cumprida a missão a que se havia proposto: despertar a consciência mundial para o drama de Timor Leste. A retirada lenta do Barco da Paz, com o território timorense à vista, o lançar as coroas de flores em memória das vítimas da opressão indonésia na solidão das águas em vez de serem colocadas, como a Missão pretendia, no cemitério de Dili, onde dezenas de pessoas foram massacradas, tudo isso deixou nos portugueses e mais certamente no povo maubere uma indisfarçável frustração. Talvez seja esse o sentir do próprio presidente da República, Mário Soares, ao não querer comentar o desfecho da jornada. De concreto, ficou o testemunho da rudeza indonésia que, uma vez mais, se mostrou insensível a argumentos expressos em flores. Ficou a esperança de que, após tanta expectativa, os guerrilheiros da resistência tivessem podido avistar, por momentos, do alto das montanhas da sua ilha, o navio que a generosidade da juventude moveu”.
Entretanto, alguns factos fizeram também história neste caso.
O governador de Timor-Leste, nomeado pelas autoridades de Jacarta, Mário Carrascalão que desenvolvia ações de duplicidade e de cumplicidade com o regime indonésio de Suharto, desapareceu. Os contactos com essa personagem tornaram-se impossíveis. Também as comunicações telefónicas internacionais com Timor (ainda não havia telemóveis) foram boicotadas.
Nessa altura, decorria em São Tomé e Príncipe a “X Cimeira dos Cinco”, com os chefes de Estado de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé, os quais foram lestos em condenar a ocupação da Indonésia de Timor-Leste, sublinhando a “vontade dos cinco em articular esforços com Portugal para contribuir para uma solução negociada para o conflito”.
Por seu turno, o secretário-geral da ONU, Butros-Ghali, apelava ao bom senso; e o deputado português no Parlamento Europeu, Lucas Pires, chamava a atenção para o facto de as autoridades indonésias permitirem a pena de morte no seu país, sendo possível que pudessem ser condenados à morte os ativistas timorenses que fossem detidos. O deputado português participava numa sessão que defendia a abolição da pena de morte no mundo, embora acrescentando que “a Comunidade Europeia não tem total autoridade moral para condenar a pena de morte no mundo, uma vez que ainda não a aboliu por completo dentro do seu território”. Já o Governo brasileiro não apoiou a Missão de Paz, apesar de alguns dos passageiros do barco “Lusitânia” serem cidadãos do seu país. A posição brasileira era de neutralidade em relação às partes em conflito. Também o primeiro-ministro australiano, Paul Keating, manifestou dúvidas quanto à utilidade da Missão de Paz do “Lusitânia Expresso” e a sua capacidade para influenciar a situação de Timor Leste.
A bênção do Nobel
Em 11 de outubro de 1996, era dada a notícia de que o Prémio Nobel da Paz, nesse ano, era atribuído a Timor, nas pessoas de Ramos-Horta e do bispo Ximenes Belo, hoje caído em desgraça. O comité norueguês reconhecia assim legitimidade à causa timorense.
Apesar de ter ficado de fora Xanana de Gusmão, o “guerrilheiro da causa” e que viria a ser o presidente timorense mais tarde, foi lembrado por Ramos-Horta quando tomou conhecimento da notícia: “Ele é que deveria ter sido o galardoado” – referiu. Já Ximenes disse que “este Nobel é para todo o povo”, ao saber também da notícia, depois de celebrar uma missa com a presença de cerca de dez mil pessoas.
Para justificar a atribuição do prémio, a mais prestigiada distinção política mundial, o Comité Nobel elaborou um comunicado às 11 horas do dia 11 de outubro:
“Em 1975, a Indonésia tomou o controlo de Timor-Leste e começou a oprimir sistematicamente a população. Nos anos que se seguiram, foi estimado que um terço da população de Timor Leste perdeu a vida, devido à fome, à doença, à guerra e ao terror”.
Ao receber o prémio, Ramos Horta referiu:
“Penso que Timor Loro Sae pode ser independente antes do fim do século”.
E assim foi, com efeito.
EFEMÉRIDES DE MARÇO
1871 – Proclamada a Comuna de Paris.
1889 – Concluída a construção da Torre Eiffel, em Paris.
1921 – Formação do Partido Comunista Português.
1965 – Alexis Leonov, astronauta russo, foi o primeiro “peão” no espaço.
1973 – “Portugal e o futuro” editado por Spínola.
1974 – Movimento militar das Caldas fracassado.
1975 – “11 de março”, confrontação junto ao RAL 1 (Lisboa)
1981 – Atentado contra Ronald Reagan, PR dos EUA.
1982 – Formada a cooperativa de rádio TSF.
1985 – Carlos Lopes vence, pela terceira vez, o Mundial de Corta-Mato.
1985 – Portugal adere à CEE.
1992 – Início da Guerra na Bósnia.
1999 – Jugoslávia bombardeada pela NATO
2011 – Sismo e tsunami no Japão causaram mais de mil mortos.
2011 – Demissão do primeiro-ministro José Sócrates.
2011 – Morte de Elizabeth Taylor.
2016 – Tomada de posse de Marcelo Rebelo de Sousa como presidente da República.
2016 – Atentado no aeroporto e metro de Bruxelas faz 34 mortos.