Segunda-feira, 9 de Dezembro de 2024
No menu items!
Eduardo Varandas
Eduardo Varandas
Arquiteto. Colunista n'A Voz de Trás-os-Montes

A Primeira República e o Catolicismo

Nas minhas itinerâncias pelas ruas de Lisboa, tenho por hábito visitar as tendas dos alfarrabistas que, esporadicamente, aparecem instaladas no espaço público, para dar uma vista de olhos aos livros aí expostos, acabando, quase sempre, por adquirir um ou outro.

Foi o que aconteceu, há uns tempos, quando caminhava pela Rua da Escola Politécnica, defronte da Igreja de S. Mamede, e entrei na que aí se encontrava colocada. Na circunstância, acabei por adquirir um livro de Amadeu Gomes de Araújo, intitulado Um erro de Afonso Costa, As Missões Laicas Republicanas (1913 – 1926), da editora Aletheia, prefaciado por Mário Soares.

Embora o tema do livro sejam as Missões Civilizadoras, formadas no Colégio de Cernache de Bonjardim, aborda também o panorama de uma época conturbada da vida portuguesa, com episódios tão controversos como o que é atribuído a Afonso Costa quando este afirmara, em março de 1911, «que em duas gerações Portugal terá eliminado o catolicismo». Tese partilhada por outras figuras gradas do republicanismo, como por exemplo, Magalhães Lima, Grão-Mestre da Maçonaria, que declarara num comício, em maio do mesmo ano, o seguinte: «dentro de alguns anos, não haverá mais quem queira ser padre em Portugal. Os seminários ficarão desertos».

A obsessão anticlerical, desse período convulso da nossa História, levou os próceres do novo regime a criar um manual doutrinário conhecido por Credo Republicano Português, que começava com a seguinte máxima: «Creio na Deusa Natureza, toda poderosa, criadora da terra lusitana». O culto da árvore, aparecia como a essência de uma nova doutrina filosófica, defendida por intelectuais republicanos, como Guerra Junqueiro e Teixeira de Pascoais. Já em 1908, a Liga Nacional de Instrução tinha promovido, em Lisboa, a plantação de árvores, por crianças das escolas, prosseguindo com a instauração da República tão inusitada iniciativa. Procurou-se, desta forma, dar ao culto da árvore o significado de uma festa nacional, argumentando-se que enquanto «organismo vivo, nasce como nós, cresce e morre como nós», para de novo voltar a renascer da sua semente.

Propunham-se até práticas excursionistas como alternativa às romarias religiosas.

A descristianização, a rutura com a Igreja, defendidas pelo programa republicano, eram alimentadas por uma linguagem bíblica, que apontava para «uma nova era», para «um novo tempo», para o «homem novo». Até Leonardo Coimbra, pai do criacionismo, mais tarde convertido ao catolicismo, defendia, em 1911, que face ao «êxodo» da Igreja Romana, o povo devia encontrar outra religião, na «imensa catedral da natureza».

Na realidade, verificamos que, apesar do radicalismo, malfeitorias e perseguições que ocorreram na vigência do regime republicano, todo o afã anticlerical acabou por ser votado ao fracasso.

OUTROS ARTIGOS do mesmo autor

O Zé Bailão

Uma cerimónia comovente

O professor Alexandre Reigoto

Spínola e o MFA

NOTÍCIAS QUE PODEM SER DO SEU INTERESSE

ARTIGOS DE OPINIÃO + LIDOS

Notícias Mais lidas

ÚLTIMAS NOTÍCIAS