Sexta-feira, 4 de Outubro de 2024
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Eduardo Varandas
Eduardo Varandas
Arquiteto. Colunista n'A Voz de Trás-os-Montes

O Zé Bailão

Era um dos filhos do Sr. António Francisco, homem sábio e muito estimado, nado e criado numa casa humilde situada na zona central de Guiães, numa ruela estreita, por detrás da antiga taberna do Toninho Monteiro, próxima da antiga oficina de latoeiro do Sr. Faustino, onde hoje se encontra o atual edifício da Caixa de Crédito Agrícola.

De estatura média, mas entroncado, o Zé Bailão — cujo apelido talvez estivesse associado ao feitio extrovertido e folgazão que denotava — sentia-se discriminado pelas raparigas da sua aldeia. Por essa razão, procurava noutras paragens das redondezas o afeto e simpatia que do género feminino sentia faltar-lhe na sua terra natal. Para ultrapassar essa contrariedade, aos domingos à tarde, punha-se a caminho da vizinha aldeia de Gouvinhas, onde se sentia à vontade pelo convívio que lhe era proporcionado pela generalidade da população e, muito particularmente, por encontrar grande recetividade nas raparigas daquela simpática aldeia duriense.

Depois dessas diversões domingueiras, regressava às origens, já noite dentro, fazendo notar o seu regresso através da excelente voz com que a natureza o dotou, revelando a sua verdadeira alma fadista, ao cantar fados de conhecidos artistas do universo fadista nacional. Recordo, ainda hoje, essa sua faceta, até então desconhecida, porquanto a minha casa situava-se, justamente, nas imediações do caminho de pé posto que ele percorria, pelo que, no silêncio da noite, o ouvi, diversas vezes, a interpretar o fado dos Belos Tempos do nosso bem conhecido Fernando Farinha.

Em 1966, reencontrei-o na nossa “Bila”, no cumprimento do serviço militar, integrado num batalhão que se preparava para partir para Angola, tendo sido selecionado o RI 13 para essa força militar fazer o chamado IAO (Instrução de Aperfeiçoamento Operacional), que todas as unidades militares, mobilizadas para o Ultramar, eram obrigadas a efetuar. Curiosamente, nesse ano, passava nos cinemas uma das obras cinematográficas mais badaladas do momento, o filme “Música no Coração”, muito elogiado pelos críticos da 7.ª Arte. Como não podia deixar de ser, no Teatro Avenida, o referido filme foi exibido durante mais tempo do que o habitual, batendo recordes de bilheteira, tendo este meu conterrâneo, e vários dos seus camaradas de armas, sido um dos muitos espectadores que não quis perder a oportunidade de assistir a tão publicitada fita de cinema.

Nunca mais tive notícias desta figura castiça da nossa aldeia, cujas vivências ainda perduram no nosso imaginário. Sei apenas que, ao regressar do Ultramar, são e salvo, à semelhança de muitos outros, optou por demandar terras gaulesas, onde acabou por se fixar definitivamente.

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